Comedouro de pássaros

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Um pequeno suporte de madeira pintado de branco, o diminuto palco para os pássaros. Contudo, é um local de alimentação, parecido com refeitório, na visão das pequenas aves. Cada um chega de um jeito e observo que, até na aproximação ao território, é possível perceber o estilo único de cada passarinho.

Os mais tímidos pousam primeiramente na pequena árvore ao lado do comedouro, como se estudassem o terreno antes de avançar na comida oferecida gratuitamente. Alguns são mais dramáticos e chegam com uma entrada triunfal, geralmente um belo rasante. De forma imponente, reivindicam seu pedaço de superfície, para realizar uma refeição satisfatória, de preferência com pouca companhia.

Reparo as táticas para que a alimentação transcorra sem concorrência, como das rolinhas que têm o apetite mais feroz, levantam uma asa, com pequenos pulos e empurrões, se livram dos oponentes. Enquanto brigam, outros mais espertos e, com certeza, não praticantes da violência, se aproveitam do duelo para se alimentarem sem interrupções. Até que o valentão vitorioso retorne e o ciclo se repita novamente. Aparentemente eles nunca desistem até conseguir o que querem.

Penso na figura de um pássaro conciliador, que com argumentos de comunicação não violenta, exporia sobre os benefícios de deixar todos os pássaros se alimentarem, pois há comida e espaço suficiente. Assim como os humanos, alguns animais também acreditam que, pela força ou esperteza, podem conseguir o que se quer. Aquela velha anedota de que todo dia sai um esperto e um otário de casa. Alguns dias queremos ser os perspicazes, mas, na grande maioria, somos somente aqueles que, se não estiverem com os olhos mais abertos, seremos passados para trás.

A linda quaresmeira, vizinha do comedouro, é um dos locais favoritos do beija-flor, que parece estar junto comigo a contemplar toda a ação que se desenrola por ali. Como um bom voyeur, observa atentamente seus primos distantes se digladiarem por comida. E o matuto que descansa até imaginar qual será a próxima flor que visitará, repousa seus pequenos pés naquele galho acolhedor. “Enquanto não mexerem comigo, continuo meu repouso”, é o seu pensamento e de muitas pessoas por aí.

Numa tarde fria de outono, quando num milagre o sol consegue romper as nuvens, vejo uma rolinha deitada, talvez esquentando sua barriga na madeira morna e sua pose é engraçada, com um olhar de quem desfruta um dia na praia. Sozinha, desempenha naquele pequeno estrado com muito gracejo, um espetáculo para os meus olhos e essa professora acidental me ensina o que é essencial. Se o sol apareceu, aproveite.

Comumente a rotina das pequenas aves é marcada por silêncio e um espírito comunitário em que todos aqueles que se aproximam têm o direito de desfrutar de uma porção de quirera, alpiste e painço. Como a vida em coletividade deveria ser. Alguns dias é possível reparar um som característico, um piar insistente e vejo pequenos filhotes do canário da terra. Fácil de identificar pela sua cor específica quando são pequenos com um tom acinzentado, em transição para seu futuro amarelo radiante e também pelo diálogo com pios obstinados, solicitando comida na boca.

E suas mães resilientes e resistentes oferecem o que querem, para aqueles que parecem nunca estar satisfeitos. Como adolescentes, discutindo que querem fazer tudo, mas perguntam o que a mãe está cozinhando para o almoço. “Quero conquistar o mundo, dentro do meu quarto e se possível com a refeição em dia” é o lema desses grandes filhotes.

E as mães pacientemente relembram que estes “pequeninos-quase-grandes” estão em processo de amadurecimento e em breve sairão voando sozinhos em busca de sua autonomia. Que encontrem pousos tranquilos e provisão para os dias nublados e para os ensolarados também.

E você deve ter percebido agora, ao chegar ao final dessa pequena narrativa, que eu não estou falando de pássaros.

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Autora: Renata Farias / @refarias1976

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