Quando meu primeiro filho nasceu, entre angústias, inseguranças e exaustão, eu lembro que perguntava para algumas outras mulheres-mães quando ficaria mais fácil. Minha sogra, de modo realista, disse que o trabalho não termina, ele só muda e aquilo me marcou profundamente.
Eu descobri na rotina diária que não importa quanto a gente se prepare para a maternidade, quantas referências, grupos, nem se comprar o que há de mais revolucionário no mercado, o ser mãe não se dá pelo consumo, nem pelo manual de instruções de outras mães, o ser mãe acontece na descoberta particular – de si e do filho -, na construção diária da relação e, embora possa haver supostamente jeitos “mais fáceis” e “difíceis” de exercer a maternidade, após se munir do máximo de informações possíveis e evidências, são nas condições e contextos de cada realidade que a mãe escolhe (ou é direcionada a escolher) o seu próprio caminho de maternar. Isso porque existem fatores determinantes no decidir, como, por exemplo: tenho rede de apoio para me auxiliar com tarefas e com o bebê enquanto retomo atividade física? Escolho ser zero telas até dois anos?
Quero amamentar exclusivamente até seis meses, porém, tenho que voltar ao trabalho quando ele tiver quatro meses e não tenho suporte para realizar extração de leite, nem cuidador que consiga oferecer o leite em recipiente que não gere confusão de bicos e desmame precoce, e aí? Eu terei condições de fazer um prato fresco contemplando todos os grupos alimentares, sendo que minha família não tem o hábito e, além de tudo, eu trabalho fora de segunda a sábado?
Falar de maternidades plurais é reconhecer que cada maternidade é cercada por um contexto, desafios, que perpassa a questão de raça e classe, que cada maternidade, dessa forma, é única, e possível. Para mim, tarefa árdua, caminho não linear, a maternidade parece um jogo que eu nunca consigo zerar.
O bebê vem para os braços, mas a mãe não tem tempo de se recuperar da maratona de parto, é peito doendo, é bebê que quer ficar grudado, leite que vaza, lágrima que escorre, sangue que se esvai. Quando posso dormir eu vigio o sono ou alguma dor me impossibilita, ou então, estou consumida pelas tarefas domésticas e lá vem cólica, tummy time, vacinas, pico de crescimento, salto de desenvolvimento, dente, virose, introdução alimentar, leitura, banho, brinquedos espalhados pelo chão, estimulação e enriquecimento ambiental, as primeiras palavras, engatinhar, ficar de pé, andar, a percepção de si e do outro, o redescobrir o mundo pelos olhos do filho, a tarefa escolar, tudo junto, misturado e mais um pouco e não necessariamente nessa ordem.
Assim tem sido para mim há quatro anos e nove meses, destes, com um plus com a chegada de um novo bebê há dez meses, e aí quando eu achava que já sabia o caminho, lá vou eu recomeçar. Não que não tenha sido mais fácil (ou devo dizer menos difícil?), de fato, quando você já conhece o caminho ou já andou por ele, tem mais segurança para seguir o fluxo. Só que lembra da história do jogo que eu não consigo zerar? Eu acho que passei de fase, num novo cenário com um novo arranjo, porém, sem atalhos, nem script e haja vida extra, porque quando penso que todas as forças se esvaíram, de modo quase que mágico eu volto pra essa função/missão que é a maternidade.
Ser mãe exige muita resiliência, empatia, consciência e maturidade para reconhecer que estou criando um ser humano, um ser sociável, que com autonomia fará as próprias escolhas – nem sempre as que eu gostaria – mas com segurança para ser quem é, para sentir o que deseja e para, com responsabilidade tomar a melhor decisão tendo respeito por si, pelo planeta e pelos outros.
Somos uma geração que tenta fazer diferente, talvez as primeiras em algumas famílias, que procura fazer melhor e isso não significa que vamos mudar o mundo (não de uma vez, nem completamente), nem que não vamos falhar. Estamos apenas reduzindo danos e abrindo caminhos para os outros que virão depois de nós e nisso, talvez, resida o zerar o jogo, finalizar a missão e deixar que outros também joguem, cada qual com suas lutas e desafios, versões atualizadas de personagens e batalhas pelas quais vale a pena lutar.
Por Jessica Bazzo – Mãe do Lucca (4 anos) e da Alessa (10 meses)