Quando a mulher dá a luz, espera-se que ela passará por diversas mudanças, e ela mesma cobra muito de si. Mesmo a depressão pós parto tem uma atribuição puramente hormonal, e qualquer comportamento fora da curva apresentado por esta mulher é interpretado como culposo num aspecto social, familiar, e até mesmo dos cuidadores ao redor. – Falo isso partindo do princípio que hoje em dia não são mais todas as mulheres que criam seus filhos naquele modelo tradicional, ou seja, muitas contam com o auxílio de terceiros. –
Muitos não sabem ou não se dão conta dos aspectos neurocognitivos que envolvem esta mudança tão grande no corpo e na vida de uma mulher que é gerar uma vida, e de acordo com os seus antecedentes genéticos, ela pode desencadear alguns transtornos mentais nesta fase que não são apenas a depressão.
Neste mês do Setembro Amarelo, que desenvolvemos a campanha especial contra o suicídio, é importante que se divulgue como tudo isso pode ocorrer para combatermos o preconceito, e sabermos como proceder quando for eventualmente a nossa vez ou de alguma outra mulher próxima que estiver passando por estas situações.
A primeira coisa que precisamos compreender sobre gravidez é que, como sabemos, nem toda gravidez é desejada, planejada, e a mulher que não deseja aquele bebê passa por um grande julgamento geral. Nem toda mulher tem uma boa condição emocional, social e familiar para bancar uma gravidez, e nem toda mulher desejou a vida inteira ter um filho. A iminência muitas vezes de se ver sozinha com uma responsabilidade deste tamanho em seus braços, de pensar no momento do parto, da possibilidade de passar por violência obstétrica perpassa a mente de muitas de nós. Por isso, nem todas as nuances são vividas por todas as mulheres ou casais da mesma forma, com a mesma intensidade, é tudo variável em tantos aspectos que nem podemos sequer imaginar.
Na medicina, a origem dos transtornos durante a gravidez e no pós parto é muito discutida, mas é possível que esta mulher já tenha crises de ansiedade ou depressão dependendo das adaptações provocadas pela gravidez, as mudanças emocionais normalmente serão provenientes dos conflitos que acontecem neste período, bem como os fatores físicos que influenciam nas mudanças desta mulher. Muitas podem sofrer disforia corporal, embora seja muito comum que vejamos mulheres se sentindo muito atraentes e bonitas enquanto gestantes, mas a mudança corporal também pode implicar em sensações desagradáveis que ela jamais esperava que iriam acontecer.
Um estudo feito por Bendeck e Rubinstein (1942) revela que grandes alterações no nível de estrogênio e progesterona influenciam no estado psicológico da mulher durante o período da gestação. Porém, não é grande o número de internações por conta de transtornos psiquiátricos durante a gravidez, pois a própria gestação possui uma influência protetora em relação a distúrbios mentais graves.
Em relação ao Puerpério, que se trata do pós parto, a mulher pode enfrentar não somente a depressão, como a ansiedade e até mesmo estados psicóticos, e durante muito tempo subestimou-se esses estados, acreditando-se que a mulher estava apenas “muito sensível”.
Principalmente se tratando da primeira maternidade, como relatado anteriormente, nem sempre a gravidez é uma experiência desejável, porém mesmo hoje em dia, considera-se que quando a mulher apresenta a psicose pós parto, é bem raro que se manifeste de forma grave o suficiente para que se necessite de internação, os transtornos mais comuns de se manifestarem são os de ansiedade e depressão.
Como eu trouxe vocês aqui para clarificar sobre a questão da Psicose Pós Parto, vou explicar brevemente de que se trata:
A psicose é delimitada por fases onde a pessoa cria em sua mente delírios e alucinações. Ela afeta a personalidade na zona central de quem ela é, os delírios podem ser de ordem conspiratória em relação a ela mesma, ou mesmo podem ser delírios de grandeza. As alucinações podem ser auditivas, visuais ou mesmo acreditar que as outras pessoas são capazes de escutar seus pensamentos. Ouvir vozes e interagir com elas é o mais comum. Assim, a pessoa no quadro psicótico grave pode vir a perder a autonomia, pois ela afeta o senso de razão da pessoa e a consciência da realidade. Normalmente quando apontados, eles não acreditam estar passando por um surto psicótico, prejudicando o tratamento.
Bem, vocês podem imaginar o que é uma mulher que acabou de parir com uma crise psicótica?
As causas da crise psicótica são somáticas ou orgânicas, por isso se a mulher já tem uma predisposição genética para tal, as chances de ela entrar em psicose são maiores nessa grande mudança em sua vida, sendo mais comum em mulheres que estão em sua primeira gestação, assim como o histórico de transtorno bipolar e que tiveram outro transtorno psiquiátrico em outra gravidez têm um risco mais elevado de recorrência.
Quando ocorre, considera-se um quadro grave, pois há um risco de suicídio e/ou infanticídio (mas é raro), e o início da crise é normalmente entre 8 e 15 dias após o parto, e ela pode começar a se sentir agitada, passar muito tempo sem dormir, com muita irritabilidade e agressividade, oscilando com um comportamento doce, além de humor instável, depressivo e irritável, e os delírios, que normalmente são de temática centrada no bebê – ela pode pensar que alguém está vindo sequestrar seu filho, negar a gravidez, o nascimento da criança ou mesmo criar fantasias de que ele está prestes a morrer -, ter atitudes agressivas com o recém nascido, desde negligentes até genuinamente brutais. Assim sendo, pode necessitar de tratamento psiquiátrico com antipsicóticos e estabilizadores de humor, ou mesmo hospitalização.
Os fatores psicossociais também influenciam, pois se o ante e o pós parto forem estressantes para a mulher essas chances podem ser elevadas, pois podem levar a conflitos de modelos maternos inadequados, ou históricos de rejeição na primeira infância tanto com a mãe quanto com o pai, ou trazer a tona conflitos não resolvidos em relação a maternidade ou ao que se espera do papel da mulher na sociedade.
A maioria dos autores pesquisados concordam que a questão do suporte afetivo é decisivo em relação aos transtornos mentais que uma mulher pode apresentar no período pós parto, portanto, isto é decisivo tanto para evitar a psicose, quanto a depressão ou a ansiedade, logo uma percepção de existência de suporte afetivo para esta mulher é mais importante do que uma real existência dele.
Outros de fatores de estresse que também influenciam são o nível socioeconômico e saneamento básico. Saber que poderá prover boas condições para aquela criança é um fator que influencia diretamente nos níveis de estresse da mãe em relação ao filho.
Sendo assim, é muito importante que nós mulheres tenhamos um conhecimento amplo do nosso emocional, se pudermos, ao ter um filho, investirmos em relações que possam nos apoiar emocionalmente neste momento. Relações tóxicas que nos geram estresse nos causam danos que podem ser irreparáveis em certas fases de nossas vidas. Sei que nem todas nós temos condições de criar essa base, mas espero que depois deste texto, cada uma de nós possamos fazer o que está ao nosso alcance para gerar seres melhores.