Naquele velho povoado — que hoje mudou muito — abriram uma estrada, chegou a luz elétrica, a água encanada, o celular, a televisão e tantas outras coisas. Chegaram também a maldade, as drogas e outros malefícios do gênero humano.
Porém, na memória da minha geração ficaram as saudades e as lembranças daqueles tempos. O transporte era a pé ou a cavalo. Foi nesse povoado que nasci e cresci, bebendo água de um tanque formado pelas águas das chuvas, que dividíamos com os animais. Eu, menina, sonhava um dia ver uma lâmpada acessa iluminando tudo.
E, no dia em que vi, meus olhos arderam tanto, lacrimejaram. Foi uma experiência horrível; pensei que ficaria cega. Ouvia falar em picolés e que eram muito frios, puro gelo. Um dia fui à cidade e me ofereceram um. Quando dei a primeira mordida, pensei que ia morrer de tanta dor nos dentes. Sofrendo pensei: “Como alguém pode comer isso?” Aí, tarde demais, me avisaram que não era para morder, era para chupar.
Cresci descalça, pés no chão. Como foi doloroso usar um sapato e me acostumar a andar sem tropeçar. Foram muitas quedas.
Com o tempo, fui descobrindo coisas maravilhosas e tão práticas para um dia a dia melhor. Adorei a escova de dente e a pasta. Adorei dormir em um colchão de molas. Adorei tomar banho embaixo de um chuveiro.
Hoje, revejo tudo isso como uma experiência que me preparou para viver o que vivo agora. Naquele mundo, dentro desse mundo, havia dificuldades — e nós a superávamos. Vivíamos sem medo e encontrávamos motivos para brincar e sorrir.
Às vezes, sinto saudades, dos momentos em que sonhava que a felicidade estava na cidade. Que engano… A felicidade está dentro de cada um de nós. Busque — e a achará — nas coisas simples da vida.
Por Maria Nazareth Doria





