Doçura em Fúria: Aprendendo a ser mãe de uma menina de dois anos,
Ser mãe de uma menina de dois anos é acordar todos os dias no centro de um furacão que também é um jardim florido. É estar diante de um ser que, recém-chegado ao mundo, já carrega uma vontade própria. É viver entre extremos: doçura e fúria, riso solto e grito agudo, abraço apertado e birra no chão da sala.
Minha filha tem dois anos. Só dois. Mas parece carregar um universo inteiro em seu pequeno corpo. Tem cabelos loiros lisos que oscilam entre o dourado e o cinza das nuvens, olhos amendoados castanhos sempre atentos e curiosos. Seus cílios longos, herdados do pai, emolduram o olhar atento de quem está descobrindo tudo pela primeira vez. Vive perguntando: “O que é isso?”, “Qual cor é essa?”. Essas perguntas são a trilha sonora da nossa rotina.
Ela sorri com uma luz que ilumina qualquer dia nublado. Mas quando o mundo não faz sentido, grita. E grita alto. O “não” vem carregado de lágrimas, gritos e drama. E eu, exausta, às vezes só consigo ficar em silêncio — ou chorar escondida.
Ela ainda chupa o dedo e isso me angustia. Tento acolher, distrair, conversar. Às vezes funciona, às vezes não. Talvez esse seja o resumo da maternidade: tentar com amor, mesmo sem garantias.
Ama cantar. “Borboletinha” e “A Ram Sam Sam” embalam seus pulos no sofá. Se deslumbra com “Moana” e “Encanto”, repete as músicas, as falas, dança com alegria e intensidade. E eu assisto encantada, por ela e com ela.
Ela adora livros, embora não tenha paciência para histórias longas. Quer entender tudo com seus próprios olhos e no seu tempo. Imagino se essa pressa já é o começo da mulher que será: dona de si, do próprio tempo e da própria leitura do mundo.
No parquinho, escala, corre, inventa. É destemida, mas me busca com os olhos para saber se estou por perto. Quer independência, mas precisa da minha presença.
Já calça os próprios sapatos e, às vezes, me deixa ajudar como quem concede um privilégio. Conta até dez, sabe as cores, tira a fralda e a roupa sozinha. E eu fico entre o orgulho e a saudade. Porque é cedo demais para tanta autonomia. Porque às vezes eu queria que ela precisasse mais de mim. Outras vezes, menos.
Ser mãe é viver nesse vaivém: amor que acolhe e esgota, que nutre e cobra. É uma gangorra entre dependência e liberdade. É ser o porto e o vento ao mesmo tempo.
Há dias em que ela me desafia com o olhar e faz o oposto do que peço. E eu, cansada, me descontrolo. Depois, peço desculpas. Porque ser mãe é isso: errar, tentar de novo, se perdoar para ensinar o perdão. É ser vulnerável diante de um amor que transborda.
Ela tem medo do lobo mau e outras criaturas das histórias infantis. E eu, que já enfrentei monstros da vida adulta, agora invento feitiços para espantar as preocupações dela. Luto com ela, de mãos dadas, contra medos invisíveis. Acolho, protejo e tento ser abrigo.
Ser mãe dela é estar diante de um ser tão singelo quanto poderoso, tão frágil quanto forte, tão geniosa quanto carente de colo. Me reconheço nela — no rosto, nas perguntas, nas emoções à flor da pele e na teimosia. Ela é uma tempestade de sol, uma confusão linda de sentimentos, uma poesia viva que me atravessa todos os dias.
E eu, que já fui tantas coisas, hoje sou, sobretudo, mãe. Mãe dessa menina que me transforma com seus olhos atentos, mãos pequenas e presença inteira.
No fim do dia, ela adormece com o dedo na boca, os cabelos espalhados no travesseiro. E eu me encho de amor e de dúvida. Estou fazendo certo? Sou suficiente? Mas ela dorme tranquila. E isso basta. Porque, apesar dos tropeços, ela confia em mim.
É essa confiança que me move. Mesmo nas noites em claro. Mesmo quando estou no limite. Ser mãe é estar, continuar e recomeçar. É amar mesmo sem saber o caminho certo. É aprender enquanto ensina.
Minha filha, com seus dois anos, já me ensinou mais sobre mim do que todas as minhas experiências anteriores. Quando tropeço, ela me estende a mão. Quando me perco, ela me puxa de volta com um beijo babado ou uma pergunta inesperada.
Ser mãe dela é desafiador. Mas, acima de tudo, é um privilégio. Por ela, eu recomeço. Porque ela me espera. Porque acredita em mim. Porque me ensina, todos os dias, que sou capaz.
E, no fundo, sou. Somos.





