Mulheres-mães protagonistas da própria história

Prematuros, aí vamos nós!

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Engravidamos e a partir do positivo já passamos a amar. Para umas é instantâneo, para outras o amor vai sendo construído com o desenrolar da gestação. Mas o fato é que amamos. E vamos a partir daí pensar por nove meses como será a chegada desse novo membro.

O que vamos precisar? O que vamos comprar? Qual tamanho? Chá de bebê, deixa mais para o finalzinho, né?

E assim vamos passando os difíceis três meses, ufa! Tá tranquilo agora. Será?

Quem nos prepara para ter um bebê prematuro? Quem nos orienta, nos ensina, nos dá dicas de como cuidar, de que roupas e fraldas vão servir? Quais os cuidados médicos eles vão precisar? Ninguém!

Exatamente, ninguém nos prepara psicologicamente e fisicamente para receber um bebê prematuro. No Brasil, 340 mil bebês nascem prematuros todo ano, o equivalente a 931 por dia ou a 6 prematuros a cada 10 minutos. O País é o 10º país no ranking mundial de partos prematuros. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), de 2020.

E ainda assim quando vamos fazer o pré-natal o tema não é sequer mencionado pela classe médica.

Pegando-nos sempre de surpresa, o que no caso de bebês prematuros uma possível preparação pode salvar vidas, 68% de óbitos de bebês prematuros poderiam ser evitados se fossemos orientadas desde o início da gestação que isso pode ocorrer e que as causas são diversas.

Entre elas, as mais comuns são o alcoolismo, tabagismo, uso de entorpecentes, estresse constante, infecções urinárias, sangramento vaginal, diabetes, obesidade e hipertensão.

É uma doença silenciosa que só se manifesta na gravidez, a incompetência de colo uterino, que foi o que eu tive e só descobri na primeira gravidez, quando entrei em trabalho de parto aos cinco meses e meio de gestação.

Aos quatro meses comecei a ter um endurecimento na barriga. Relatei ao obstetra e o mesmo disse que era o bebê mexendo. Fiquei internada por uma semana e não houve sucesso em reverter o caso; o colo abriu todo e o parto foi induzido. Bárbara nasceu com 22 semanas, 570 gramas e sem vida devido à extrema prematuridade. Enterrei minha linda filha e com ela todos os sonhos, planos e amor.

Saí da maternidade de braços e coração vazios. De luto, um luto que muitas vezes não é validado. Ouvi muitos dizerem: “Foi livramento, ou você não conviveu, não é? Difícil é quando perdemos grande!”

A dor jamais pode ser mensurada e o tempo do luto cabe a cada um em particular.

E assim esperei um tempo e novamente fiquei grávida. Fazendo pré-natal com outro médico, ouvi dele que a gravidez dessa vez iria ser normal. E assim segui com a vida até começar a sentir os mesmos sintomas: contrações por volta dos quatro meses de gestação.

Procurei outro ginecologista, mais velho, mais experiente e, após ouvir atentamente a minha história, ele me diagnosticou com provável incompetência istimo cervical – quando o colo do útero não suporta o peso do bebê.

E agora? Perderia outra vez? Fiquei muito abalada, mas busquei forças no meu interior e faria exatamente o que o médico dissesse.

E assim foi, dois meses deitada, muitos remédios para diminuir as contrações e injeções para preparar o pulmão da criança.

E com 32 semanas a bolsa simplesmente estourou, devido a uma infecção de urina silenciosa. Foi uma verdadeira corrida contra o tempo para salvar a vida da minha filha. Vitória nasceu, com 1,800 kg, dez dias de UTI e 20 dias até aprender a mamar. Vim para casa com uma criança pesando um quilo e meio. Como cuidar? Que roupas vestir? Que fraldas usar? O desenvolvimento seria normal?

Não, nada foi normal; existe todo um cuidado específico com a criança prematura. Ela é por natureza mais frágil e o seu desenvolvimento é corrigido conforme a idade gestacional. Teve refluxo, intolerância a lactose, baixo peso, muitas noites em claro, muitas idas ao pediatra e infinitas dúvidas. E só fomos aprendendo ao longo do percurso, errando e acertando.

Quando pensamos em preparar a mãe para um possível parto prematuro não significa que vamos aterrorizá-la, mas orientá-la caso isso aconteça.

E com todo o avanço que temos na medicina ainda não é possível diagnosticar essa doença previamente, uma vez que o exame que detecta é invasivo e doloroso e quase nunca solicitado pelos médicos.

E assim seguimos na luta para ter mais filhos. Engravidei novamente e com esse diagnóstico a médica achou por bem fazer uma cerclagem, costurando o colo do útero, para tentar levar a gestação adiante. Procedimento que só pode ser realizado em até 12 semanas, pois há o risco de estourar a bolsa.

Mas infelizmente fui acometida novamente por uma infecção que estourou a bolsa e, com 22 semanas, Julia veio ao mundo. Tentou viver, respirou, mas seu pulmão frágil não suportou. Virou anjo assim como a primeira irmã, Bárbara.

Após cinco anos lá vamos nós novamente tentar, dessa vez com uma médica especialista em gestação de alto risco. Não fizemos cerclagem, mas foram seis meses deitada, uma infecção de urina que me deixou um mês internada, tivemos perda de líquido, e o parto foi realizado com 36 semanas. O pulmão foi todo preparado com medicações para um possível parto prematuro.

Ana Luiza nasceu com apenas 1,690 kg, não precisou de UTI – ficou apenas dez dias para ganhar peso. Mas como todo bom prematuro que se preze muitas foram às lutas, refluxos e gripes aos montes.

O que quero levantar é a necessidade da conscientização sobre o parto prematuro, mesmo sendo um tema difícil de debater durante a gestação, pois estamos com os hormônios à flor da pele. Mas é preciso conscientizar as mães e sensibilizar os médicos, pois muitas vezes relatamos algo e não somos validadas.

Hoje temos algumas lojas especializadas em roupas e fraldas, mas nunca sabemos onde buscar até surgir a necessidade de ir atrás. Até as vacinas que eles tomam são disponibilizadas em outras unidades de saúde.

Conscientizar não é esperar pelo pior, mas estar ciente que isso pode acontecer e estar relativamente preparado caso ocorra.

A luta é grande, mas vivenciar cada vitória de um prematuro e ver a sua garra infinita é uma alegria sem fim!

Autora: Kelly Ferreira – @kellyfeesposito.
Texto revisado por Luiza Gandini.

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