Mulheres-mães protagonistas da própria história

Para levar um bebê a uma festa (de adultos)

Para levar um bebê a uma festa (de adultos)

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Mães de bebês pequenos que não se conhecem se cumprimentam na rua com um sorriso leve, só de lábios. Outro dia vi um homem que usava muletas andando na calçada, e ele cumprimentou da mesma forma outro homem que usava muletas e passou por ele.

No sábado estávamos passeando pelo bairro e um homem desconhecido que carregava um bebê no sling levantou os dois braços, abriu um sorriso largo, e gritou “salve, pai!” para o meu marido, que também carregava minha filha no sling do outro lado da rua. Se alguns homens soubessem como é brochante quando percebemos que eles levam a vida brincando de casinha, de guerra, ou de trabalhar, talvez fizessem menos papel de bobo. Ou talvez não.

Quando nos tornamos mães os amigos mudam. Já ouvi outras mães dizerem que não passaram por isso, que os amigos pré-maternidade formaram uma rede de apoio presente. Na verdade só ouvi uma única mãe dizer isso, e ela me pareceu muito velha, imaginei que só tinha amigos velhos que não tiveram filhos próprios, então me sinto autorizada a generalizar e dizer que quando nos tornamos mães os amigos mudam. 

Não é que todos os amigos anteriores passarão a ser meros conhecidos, só alguns; outros sumirão completamente; e o resto vai estar por ali, assistindo à sua situação sem se envolver, e pronto para fazerem coisas que você fazia com eles antes de se tornar mãe — o que não é muito útil porque você não consegue mais fazer a maior parte das coisas que fazia antes. 

Quando conseguimos, por exemplo, deixar o filho em algum esquema avó-babá e ir a uma festa como as que íamos (na casa dos mesmos amigos de sempre, com os mesmos convidados de sempre, mesma trilha sonora, mesmos assuntos que adorávamos e curtíamos até o sol raiar) não faz mais sentido. 

As conversas, sobretudo, são muito desinteressantes e a distância se torna evidente. Provavelmente porque estamos acostumados a outro nível de adrenalina, de emergência, de senso de necessidade. O assunto teria que ser forte demais para prender nossa atenção: chupeta versus dedo, por exemplo.

Precisamos espremer um lugar intermediário entre o lugar novo que ocupamos, o que ocupávamos, e o que os amigos ocupam; é como cavar uma mina — o que dá para fazer, mas exige bastante tempo e suor.

Ir a uma festa com um bebê não é menos desconfortável. Você vê que as pessoas se arrumaram para estar ali. Se organizaram, nem que tenha sido para chegarem atrasados com a mesma roupa de sempre, isso foi pensado. 

Estar na festa com o bebê é ter levado algumas opções de comidas na mochila, alguns brinquedos na mochila, ter levado uma mochila. Ter escolhido a roupa, talvez pela primeira vez para uma festa, para não dar lance. É ter que lidar com o cansaço explosivo do bebê a qualquer momento da festa, seja pelo som alto ou porque seus amigos mais próximos e antigos são, para o seu bebê, desconhecidos desajeitados, efusivos demais com crianças.

Na última festa que fui com minha filha eu tive um momento a sós quando meu marido saiu para passear com ela pela rua e assim prolongar nossa vida útil ali. Uma mulher puxou papo comigo e foi como se um raio de luz surgisse à nossa volta em plena noite de inverno. 

Infelizmente ela logo começou a falar sobre maternidade: como dava trabalho, quantos anos minha filha tinha, que lindo. Apesar de preferir falar sobre outros assuntos com uma desconhecida, ela parecia ter boas intenções e perguntei se tinha filhos, já sabendo que não, pelo olhar curioso em minha direção. 

Era amiga de um amigo da aniversariante e tinha 22 anos. “Você já voltou a trabalhar?”. Não. O meu ponto fraco em cinco minutos de conversa, essa geração é mesmo boa — rapidamente passei a desejar a conversa desinteressante dos meus amigos. 

A garota então falou animada sobre como a aniversariante, que já voltara a trabalhar nove horas por dia, era maravilhosa, “nossa, ela consegue fazer todas as coisas, estudar, trabalhar, cuidar da casa e de um bebê!”. É. Eu pensei em responder que a aniversariante já me falara algumas vezes que prefere trabalhar o dia inteiro do que passar meio período sozinha com o filho — o tédio, o cansaço, a solidão louca, a dependência recíproca, a insegurança. Mas sorri e concordei.


Autora: Gabriela Rocha é de Recife mas mora em São Paulo. Formada em Direito e Jornalismo trabalha como preparadora, revisora e escritora. É feminista e mãe da Teresa e do João.  Instagram: @gabimmrocha.


Este texto foi revisado por Juliana Moura.

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