Mães e pais sabem que, depois dos filhos, acabamos indo ao cinema metade das vezes (ou mais) para ver filmes infantis. Além de ser uma boa forma de nos conectarmos com as crianças e ter uma diversão cultural e tranquila, o fato é que, na maioria das vezes, programas em que toda a família se diverte acabam sendo mais fáceis de colocar em prática do que os arranjos para pegar um cineminha romântico como antes da prole. O jeito, então, é encontrar atrações cinematográficas que possam agradar crianças e adultos. Por sorte, a indústria do cinema percebeu esse nicho e vem produzindo muita coisa boa. Exemplo disso é o filme Divertidamente, cuja continuação estreou recentemente.
O primeiro filme mostra a garota Riley na primeira infância. Enquanto as crianças se divertem com as confusões que as emoções na mente da menina fazem se debatendo para encontrarem seu lugar e contribuir para o desenvolvimento dela, os adultos podem, além de dar boas risadas, acompanhar um enredo que, de fato, explica muito sobre a própria infância e, portanto, sobre a fase psicológica dos filhos pequenos. Já Divertidamente 2 acompanha Riley em sua entrada na puberdade, com todo o descontrole emocional típico dessa fase e, novamente, os pais podem aproveitar a sessão para, além de se divertir, tentarem entender o que se passa com aquela criança outrora tão meiga que, de repente, parece se transformar num Trol em alguns momentos.
Ouço muitas mães reclamarem de como o desafio da maternidade fica ainda pior por conta da diversidade de informações e tendências em torno da educação de filhos. Não é que a disponibilidade dessa gama de estratégias, abordagens respeitosas e informações sobre possíveis diagnósticos psicológicos não seja positiva. Mas, muitas vezes, parece aumentar ainda mais a tão pesada carga mental materna. As redes, através de algoritmos cada vez mais complexos, despejam uma enxurrada de novidades em nossos aparelhos e aplicativos, diariamente. Assim, mesmo que a mãe não procure, ela vai encontrar informações muitas vezes alarmantes sobre qual pode ser o significado do comportamento dos filhos. O maior desafio: a sensação de estar sempre atrasada com algum conhecimento, de estar sempre errando em algum detalhe. A culpa materna multiplicada pelo excesso de informação.
Mas longe de buscarmos ser mães perfeitas, o que nós, mulheres-mães, precisamos é de mais leveza. Precisamos ter, sim, orientação sempre que necessário sobre como conduzir a maternidade, uma rede de apoio que pode até mesmo dar opiniões (se requisitado) e, principalmente, que esteja lá para permitir que essa busca não consuma vinte e quatro horas do dia da mulher, e companheiros-pais que, de fato, percebam que essa missão é deles também.
Nesse sentido, o filme de Pete Docter pode ser uma boa opção. Embora ele trate de questões delicadas da adolescência, como ansiedade (até um ataque de pânico), solidificação da identidade e as desafiadoras mudanças dessa fase, faz isso de forma divertida. Não se trata de minimizar esses desafios ou negá-los, pelo contrário. O filme (como o primeiro, aliás), inclusive, toca na questão do perigo de se negarem emoções e sentimentos, suprimir lembranças ruins em vez de lidar com elas. De uma forma suave, pois usando a comédia, ele faz pensar sobre a necessidade de se acolher nossas emoções, todas, mesmo aquelas que nos tornam humanamente falhos e, às vezes, pessoas cruéis até. Vendo dessa forma, é possível nos entendermos, ao mesmo tempo, como responsáveis por conduzir os filhos nessa caminhada e como pessoas merecedoras de compreensão e apoio em nossa própria caminhada. Quando a Alegria entende que precisa acolher até mesmo os maiores erros da garota, esse recado também vai para as mães, pais e demais adultos que assistem.
Quando Riley explode as emoções reprimidas e, a partir daí, sente-se mais leve e, por isso mesmo, capaz de voltar a ser quem ela realmente é, esse recado ecoa dentro de cada adulto que assiste com suas crianças, não apenas os filhos, mas também sua criança interior. O filme conversa com aquele senso de si que, muitas vezes, debaixo de tanta ansiedade, autossabotagem e culpa, fica soterrado e incapaz de demonstrar o quanto podemos ser boas mães, não porque estamos fazendo um esforço hercúleo para colocar em prática tudo que lemos em todos os manuais, mas porque temos dentro de nós a estrutura necessária para acolher nossas crianças, em toda sua complexidade humana, capaz de grandes erros e grandes feitos. Saí da sessão com essa ideia de que, talvez, o melhor caminho seja buscar essa leveza e, divertidamente, acolher a criança interna para poder acolher a criança ao meu lado.