Deusas não morrem – Elza Soares

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Elza Soares faleceu aos 91 anos em sua casa. Meus olhos custam a entender as palavras escritas na tela do computador. 

Elza disse que vai cantar até o fim do mundo. Será que estamos no fim do mundo? Do jeito que andam as coisas, parece que sim. Liguei o som, pra entender se ainda estava viva. Senti Elza atravessar todo meu corpo, sua voz rouca, potente e vívida me dizendo que não vai sucumbir. Percebi que ainda não era o fim do mundo.

Em sua primeira aparição pública, num programa de calouro, Elza era muito jovem, pobre,  já era mãe e pesava 35 kg. Subiu no palco num vestido todo ajustado com alfinete, com a sandália “mamãe tô na m*rda” e duas maria chiquinhas. De imediato, risos na plateia. Sua presença foi impactante. 

– De que planeta você veio? – Perguntou o apresentador.

– Do mesmo planeta que você – respondeu Elza com lágrimas no rosto.

– E que planeta é esse? – questionou o homem.

– O planeta da fome – Elza encerrou a conversa e cantou.

E nunca mais parou de cantar. Planeta Fome é seu último álbum lançado, em 2019. Do jeito que começou, ela se despede da vida. Sua voz atravessou a pobreza, o racismo, machismo, o exílio. Tem todo um Brasil na sua voz, com todas as suas contradições e complexidades. 

“Brasis

Tem um que faz amor 

E outro que mata”

“Quero ver nosso povo de cabeça em pé”

Mulher apaixonada, crítica e conhecedora do nosso país. Uma artista revolucionária, criadora, criativa, molhada, ousada, inovadora, linda, sexy, desobediente, sensível. 

“O seu país, é seu lugar de fala. Sua voz, usa pra dizer o que se cala”. 

Ela nunca se calou, sua voz está viva, pulsante e a força de seu timbre e suas ideias são capazes de chegar até depois do fim do mundo. 

Deus é mulher. Elza agora é deusa.


Texto: Jessica Marzo. Feminista, mãe, comunicadora, cientista social, escritora e cocriadora da página @prosamiuda.

Autor

  • Jessica Marzo

    Comunicadora, cientista social, escritora e mãe de duas meninas pequenas. Trabalho na produção de conteúdo para projetos do terceiro setor na área de Educação, Direitos Humanos e Meio Ambiente. Escrevi o livro “Bento não tem cabimento” (Editora Uratau), fui co-autora da coletânea de poemas feministas Bertha Lutz (Editora Persona) e criadora da página Prosa Miúda junto com um coletivo de escritores. Instagram: @jemarzo. Site: jemarzo.wixsite.com/minhasescritas/blog.

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