Mãe, pesquisadora, professora, extensionista! Palavras as quais, para muitas pessoas, podem ser antagônicas e difíceis de comporem a mesma pessoa. Para mim, parte orgânica do meu ser. Mas, como pode?
Tenho uma filha de 3 anos. Quando ela nasceu, eu já era professora, já trabalhava com pesquisa e com extensão. O trabalho de campo é, sem dúvida, uma das minhas maiores paixões. O trabalho de em campo envolve: organizar os materiais disponíveis sobre o território; organizar o roteiro e pensar nos motivos e objetivos a serem alcançados; ir ao campo; sistematizar o trabalho de campo, correlacionando-o através da indissociável relação com a teoria. O trabalho extensionista envolve, portanto, a pesquisa.
Minha filha realizou o seu primeiro trabalho de campo comigo aos 4 meses. Foi a primeira vez que ela se juntou a mim e a seu pai na nossa jornada de trabalho. Para nós, era, sem dúvida, uma experiência desafiadora, porque, o rito do trabalho de campo foi subvertido para compartilhar a nossa dinâmica familiar alegre e atenta a nossa filha.
Por isso, para que a mãe realizasse o trabalho de campo, foi necessária a presença paterna, que também estava ali trabalhando. Nos tornamos, então, uma família trabalhadora. Nossa filha, tal qual na agricultura de base familiar, se tornou um componente importante no processo.
Mas então, como nos organizamos? Antes de pensar no campo em si, a pesquisa inicia através do contato com a GeoMamas, uma rede de mães geocientísticas. Aqui, conversamos com algumas mulheres sobre a experiência de campo, as quais destacaram algumas dificuldades encontradas. As dificuldades podem ser classificadas em 3 grupos: econômicas; institucionais; de rede de apoio.
Boa parte das mulheres desistiram dos trabalhos de campo, importantes para suas carreiras, devido a motivos financeiros, pois algumas não dispunham dos recursos necessários para levar seu neném ou criança junto, já que ou não possuíam rede de apoio ou se sentiam mais à vontade em campo com a/0 filha/o por perto.
Outras mulheres, encontraram dificuldades institucionais para levarem suas/eus filhas/os, já que as universidades ou empresas para as quais trabalhavam tinham resoluções contrárias à participação das crianças. Algumas mães relataram que foram no carro dirigindo com a criança, enquanto o ônibus com o restante da equipe ia na frente.
A maioria das mulheres, precisaram acionar suas redes de apoio (amigas, familiares, cônjuge) para que o trabalho de campo pudesse ser realizado.
Após conhecermos essas histórias, as mães nos falaram do que seria indispensável para o nosso trabalho de campo: boa acomodação; materiais de primeiro socorros; roupas para frio e calor; roupa de cama e banho próprias; canguru ou sling e, se possível, uma cuidadora.
A nossa equipe de trabalho era extremamente receptiva à presença de nossa filha, então, ficamos na mesma casa da equipe e utilizamos os mesmos transportes, quando possível. Acionamos a cuidadora apenas nos momentos do trabalho externo.
O trabalho de campo envolvia a realização de uma série de oficinas em comunidades diferentes. Foram 3 dias de intensas oficinas, nas quais minha filha participou ativamente através das risadas, choros e sonecas.
Essa experiência, apesar de cansativa, me possibilitou o fortalecimento da força que eu sempre carreguei, me trouxe a confiança necessária para o retorno dos trabalhos e, sem dúvida, me aproximou ainda mais da minha filha. Desde então, ela já participou de diversos trabalhos de campo. Hoje, com três anos, ela vai para trabalhos de campo, se diverte com as crianças (quanto mais criança, melhor!) e adultos presentes. Me ajuda com os materiais de campo e sempre leva seus livros, brinquedos e comidinhas para compartilhar com as pessoas presentes. Ela também chora e diz que quer ir embora e tudo isso faz parte da nova mãe, pesquisadora, professora e extensionista que eu me tornei.
Longe de romantizar esse processo, devemos ter em vista que os espaços de pesquisa e extensão devem se abrir institucionalmente para a presença de crianças e que nós, mulheres, temos o direito de criar nossas crianças através do envolvimento com o nosso trabalho, torná-lo mais colorido.
Importante ressaltar, ainda, que o produtivismo e o modelo de produção científica não abarca as nossas realidades, o que coloca para nós, a necessidade de construir uma institucionalidade onde caibam muitos mundos, inclusive o infantil, mas isso é papo pra outro texto…