O que duas jovens paulistanas seriam capazes de fazer na vida de uma mãe preta do interior?
Não precisei nem de dois dias para obter tal resposta.
Uns chamam de oficina, eu, imersão. Imersão que buscou no corpo, na pele, na subjetividade do meu ser à procura de respostas. Mas será que as perguntas que estão sendo feitas são as certas? Será que são necessárias?
E pensar que a inscrição quase falhou. Mas ela, como uma gota sutil do mar, me impulsionou. Como uma onda, me inundou.
A mãe preta pode, enfim, permitir-se! Sua hora é agora. Por você, pelos seus, com os seus.
E num dia comum da vida desta(s) mãe(s), um simples detalhe incluído em sua rotina fez a turbulência do dia transbordar e fazer companhia para a chuva torrente dos últimos dias. Porque no dia a dia de cardápios da semana programados, boletos pagos (ou com a intenção de pagar), banhos corridos, roupas lavadas e passadas, lanches preparados, brinquedos guardados, tarefa escolar, ração para o cachorro, árvore de Natal acesa, trânsito das 18h e abastecer o carro, ela se esqueceu de abastecer o carro. Ela sabia. Ela se programou, mas se esqueceu. E com isso, seu combustível também zerou. É assim que, por vezes, o desespero surge. Nos sentimos inúteis e despreparadas, ou até mesmo incompetentes, não importando se somos “recém-maternadas” ou veteranas. A cobrança vem. Ela chega e se instala, fazendo com que aquela mulher preta antes segura desabe.
Mas, como diz o mano Emicida, “quem tem um amigo tem tudo!”, fui resgatada! Com a rapidez de um foguete de dar inveja à Nasa, ela chegou. Junto dela estavam Carolina, Maria e Jesus, e pude assim reerguer-me! Seus versinhos doces trouxeram ânimo, cor e animação.
Voraz e única como González, me tirou do fundo; clareou meu caminho de maneira firme e leve, com muita credibilidade e respeito, e escureceu minhas raízes, fazendo-as profundas e notáveis. Junto delas, muito amor. Este amor que sempre se faz presente, ora bem sutil, querendo espaço, ora intenso, invadindo e quebrando tudo. Sabiamente aquieta o aflito coração; vira abrigo, porto seguro, mesmo quando o tiroteio nos rodeia.
Quando vidas se conectam sem que haja disputa e sim sororidade na busca de apoio e escuta, novas experiências nos permitem validar todos os sentimentos encontrados nesta batalha interna. Externar tais emoções é reconhecer que dentro das nossas fragilidades pode surgir a força que tanto acreditamos não ter.
Partilhar vivências numa roda de mulheres, das quais a maioria é mãe, faz com que a cor da pele seja só um detalhe, mas, como são os detalhes que fazem a diferença, numa roda de mães pretas, a mãe branca contribui conscientemente e reconhece seu privilégio, mas entra de cabeça neste front, tomando para si também essa frondosa luta, por vezes tão solitária, embora mães pretas formem a grande maioria por aqui.
E como a letra da canção de Jammil e Uma Noites: “… uma estrela só não é constelação”, mas nós somos! Somos luz!