Shondaland: sobre escolhas e limites

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É comum para muitas mulheres-mães ouvirem a pergunta: como você dá conta de tudo? Essa pergunta, embora venha geralmente na intenção de reconhecer e até elogiar os esforços dessas mães pode ser, na verdade, motivo de angústia.

Shonda Rhimes, premiada roteirista e produtora que tem, literalmente, uma terra com seu nome, a Shondaland, outro dia me fez pensar em tudo que vou fazer e o que não vou fazer por estar nesse lugar de mãe. Ela é uma mulher bem-sucedida, criadora de sucessos da TV norte-americana e mundialmente reconhecida por seu trabalho. Mãe solo de três, conta que ao receber esta pergunta, “como você faz tudo isso?”, simplesmente quer responder que não faz.

É realmente inevitável, como afirma Rhimes, fazer tudo o tempo todo e de forma infalível. Sempre haverá um aspecto da vida que ficará em suspenso enquanto nos dedicamos a outro. Às vezes temos a ilusão de que temos os tais superpoderes de fazer várias coisas ao mesmo tempo. E essa impressão não é à toa. Não faltam vozes dizendo-nos que podemos. Seja na família, no trabalho, na TV, ouvimos o discurso de que mulheres, diferente dos homens, são multifuncionais. Talvez tenhamos desenvolvido a habilidade de “dar conta” de mais de uma coisa ao mesmo tempo. Mas será que quando fazemos essas multitarefas elas realmente estão ficando como desejamos que fiquem? Ou, depois, vamos ter que refazer, corrigir, ou nos conformar com os problemas que surgem dessa sobrecarga? E, mais importante: qual é a consequência disso para nós?

Em discurso por ocasião de seu doutorado em Artes, Shonda faz essa reflexão. Quando está arrasando em produções como Gray’s Anatomy ou Scandal, está deixando de lado momentos com as filhas. Quando está costurando a fantasia de halloween para elas, está falhando ao perder gravações. Não é possível estar fazendo ambas as coisas ao mesmo, pelo menos não da forma como queremos fazê-las. E é também, inevitável, a frustração por não conseguir. Mas de onde vem essa expectativa de que façamos tudo?

Quando nos deparamos com a pergunta “como você dá conta de tudo isso?”, ainda que essa não seja a intenção de quem tenha perguntado, internalizamos um fato que é, na verdade, fabricado por esse discurso: o de que teríamos que dar conta de tudo o tempo todo. O que é mais curioso nisso é o fato de ninguém perguntar isso a um pai. Por quê? Não se espera que ele dê conta de filhos e seja lá o que mais for que tenha escolhido para sua vida.

Essa fala de Shonda me fez pensar que cada vez mais nossa resposta a essa pergunta deve ser igual à dela: não estou dando conta de tudo ao mesmo tempo. É preciso naturalizar que nós, mulheres-mães, podemos fazer nossas escolhas e lidar com elas da forma possível, sem que ninguém espere que sejamos infalíveis em todas as áreas, que possamos dar conta de tudo ao mesmo tempo, o tempo todo e sem apoio.

Para mim, por favor: uma coisa de cada vez!

Serviço:

Autor

  • Regina Miranda

    Regina Miranda é autora de três livros publicados com a editora Caravana, sendo um deles o infantil "O sabor das coisas", cuja história foi co-criada com a filha, de cinco anos na época. Também participa de coletâneas como com o Selo OfFlip, e publicações em revistas digitais, como a Revista Intransitiva. Apaixonada pelo universo da literatura, é formada em Letras pela UFPR com especialização em Educação a Distância pelo Senac. Já foi professora no ensino fundamental e, hoje, leciona aulas particulares de produção de texto, além de participar da organização do Clube de Leitura Feminista em Curitiba, onde mora atualmente. Divulga seus trabalhos literários e reflexões diversas pelo perfil de Instagram @reginaliber2020

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