Conheci uma mulher que passou por violência doméstica. Ela nunca aparecia com marcas, com roxos, ou com cicatrizes. Hoje, acredito que ela deve ter muitas.
Eu pensava quando ela me falava, mas só escutava: “não é bem assim. Ele parece tão bom. Ele vai à missa. A mãe reza por ele. Ele toma remédios. Coitado. A mãe faz parte da Igreja.” Hoje, acredito que ela estava adoecendo emocionalmente. Não sabia o que vivia.
Quando não vemos o sangue, não acreditamos que uma mulher sofre violência. Ela sofreu. Por mais de 20 anos, e se estendeu aos filhos.
A violência doméstica é silenciosa. Antes eu acreditava que só era violência quando chamavam a polícia. Hoje, acredito que a violência não tem sangue escorrendo, mas tem muitas outras substâncias escorrendo. A vida escorre nesta violência.
A violência doméstica é constante. Escondida. O agressor é a vítima. A agredida é a causadora. Ela achava isso. “O que posso fazer para salvar ele?” Hoje, acredito que poderia ter salvado a juventude dela. Ela não precisava estar com 47 anos para descobrir tudo isso.
Não nos importarmos com a dor do outro, aceitar traições, gritos, palavras duras, ameaças, tempestades, agressões físicas, ou agressões silenciosas, ausência de responsabilidade familiar e sangue não pode ser problema da outra pessoa. Não pode ser problema daquela família. Não pode ser problema da religião. Do padre, do pastor, da mãe de santo, é um problema público.
A mulher que conheci acreditava que a religião salvaria sua violência doméstica.
A mulher que conheci acreditava que não poderia abandonar seu agressor.
A mulher que conheci jurou ficar ao lado dele mesmo que o mundo o abandonasse. Foi uma promessa, mas ela esqueceu de perguntar se ele fez este pacto com ela.
A mulher que conheci foi abandonada com os filhos, com seus sonhos, com seus planos, com suas feridas expostas, com muitas dores.
A violência doméstica não deveria ter perdão. Ela destrói a alma. E reconstruir a alma é nascer de novo.
Por Manuela Palma – @manuelapalma___
Revisão: Gisele Sertão