Por Bruna Borges
Não, não é um conto de fadas o home office materno. É uma realidade contemporânea potencializada com a pandemia que, apesar de ser fundamental para a presença de muitas mães no mercado de trabalho, reacende e escancara a sobrecarga das mulheres.
Há uma romantização sobre o “trabalhar de casa” e estar próxima aos filhos. Escuto muito “que maravilha você poder estar de home office e ficar com as crianças junto”. Mas as pessoas esquecem que é um trabalho como qualquer outro e requer tempo, assim como as crias também. E estar pensando em reunião e agindo ao mesmo tempo que dá banho, alimenta, brinca, dá atenção, entre outras demandas, além dos afazeres domésticos, não é tarefa simples.
Agora acompanhem comigo: saltar da cama, organizar café da manhã para criança e adolescente, lancheira, banho, levar para escola, organizar as coisas do pet, agilizar almoço, tomar o meu café da manhã já na frente do computador, enquanto a roupa bate na máquina (um beijo no cangote de quem inventou essa ferramenta), pronto, o dia voou, são 4pm. Saio pra buscar a pequena na escola, volto para o “computar” enquanto dá, almoço, converso, dou banho, faço tarefa, coloco pra soneca da tarde… Isso foi apenas uma parte do dia, digamos que 1/3.
Escolho o feijão na frente do computador, trabalho com baby shark de fundo musical e o cenário é brinquedos espalhados enquanto minha filha cobra atenção. Já cheguei a participar de reunião online amamentando (tem quem diga “que fofo”). Quando “largo” o trabalho no computador vou fazer o doméstico, que é infinito. Estar em casa parece um looping eterno e assim, segue mais um dia. Para alguns somos heroínas (quem disse que queremos ser?), para outros somos chatas que reclamamos de tudo, mas o que somos é: humanas em exaustão. Sem contar a nossa socialização. Se para as mães que trabalham de casa socializar é o único momento para conviver com outros adultos, sem filhos, como fica pra quem está remotamente e praticamente 24h com as crias?
O trabalho remoto chegou pra ficar, fato, e para muitas pessoas é uma maravilha, economia de tempo e dinheiro. Mas para que seja sem adoecimento materno seria necessário suporte. Não temos creches/escolas públicas de qualidade e com carga horária suficiente (além dos dias que não funcionam), e as particulares integrais são valores exorbitantes. Então o máximo que conseguimos é um tempinho “livre” quando estão na escola, isso quando estão em fase escolar. Ahh, e a rede de apoio? Fala-se muito, mas, na prática, não são todas que tem.
Há algumas décadas, as mulheres tinham como ocupação principal a responsabilidade pelos cuidados domésticos e dos filhos, o que já era uma grande demanda, mas por volta de 1970, houve uma impactante inserção feminina no mercado de trabalho, e para tal, optava-se pela não maternidade ou por deixar os filhos aos cuidados de outras mulheres (babás ou familiares), mesmo assim, trabalhar fora foi uma conquista. Ainda temos salários menores, somos poucas em cargos de liderança e somos as primeiras a serem demitidas quando mães.
Não nego que para meu contexto atual só cabe o home office. Para ser presencial, teria que ganhar bem melhor. Mas quando vejo a minha realidade e a de muitas mães que trabalham de forma remota, cuidando de toda demanda dos filhos e casa, fica uma inquietação: numa sociedade machista, a falta de cooperação, seria uma forma de reforçar o patriarcado?
Revisado por: Joana