Mulheres-mães protagonistas da própria história

A pergunta eternamente sem resposta: Quem cuida de quem cuida?

A pergunta eternamente sem resposta: Quem cuida de quem cuida?

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Eu já vi algumas dúzias de postagens em redes sociais problematizando o cuidado e o papel do cuidador na sociedade. Também já li algumas matérias em jornais e vi o debate crescer substancialmente ao longo da pandemia. Mas, apesar de toda a discussão, ainda não consigo vislumbrar uma solução efetiva para a questão do trabalho não remunerado de cuidar. 

Sim, o não remunerado, pois existem os cuidadores profissionais, sejam eles médicos, enfermeiros, babás, (complete aqui com o que você lembrar) que bem ou mal são pagos para cuidar, e que, cabe destacar, são postos de trabalho majoritariamente ocupados por mulheres, as mesmas que igualmente são as principais responsáveis pelo cuidado doméstico. 

Eu poderia aqui escrever longamente sobre como educamos as crianças para desempenhar papéis sociais, ficando as meninas com a fatia do cuidar, ninando bonecas, fazendo comidinhas de lama e coisas do tipo, enquanto os meninos conquistam o universo com suas naves espaciais entre uma batalha e outra para garantir que cresçam viris. 

Sim, eu sei você vai dizer que isso está mudando, que as famílias de hoje são desconstruídas e coisa e tal, mas honestamente em um país que elegeu um sujeito como o que preside a nação atualmente, sabemos que não é bem assim. 

Os papéis masculinos e femininos ainda são impostos pela sociedade de maneira extremamente conservadora, em um estado que deveria ser laico, mas que envia o vice-presidente para Angola para defender os interesses de uma certa instituição religiosa extremamente duvidosa, mas que aparentemente governa o país. 

Enquanto isso, as mulheres cuidam. Da casa, dos filhos, irmãos, maridos, pais. Cuidam no trabalho, acho que mesmo aquelas que não exercem profissões de cuidado, de uma maneira ou outra cuidam. 

Elas cuidam inclusive daqueles que as agridem, violentam, impõem que seu lugar é de servidão, seguem servindo sujeitos assim por vezes a vida toda, pois o sistema que culpabiliza a vítima e fornece quase nenhuma punição a agressores é difícil de enfrentar, massacrante, e na maioria das vezes, estamos exaustas e mal pagas. 

Sim, mal pagas, pois em uma sociedade mais igualitária e justa haveria de existir algo mais que um salário para aquelas que se dedicam ao cuidado da família, o que não só seria um reconhecimento como trabalho de que todo esse ciclo de cuidar das crianças, dos idosos, da casa e tudo mais que vem no combo “dona de casa”, como também daria a estas mulheres a sua independência financeira, o que convenhamos, é um ponto muito importante para romper com relações de violência doméstica e abuso. 

São tantas camadas sobrepostas na pergunta que dá nome a este texto que precisaria de muitas páginas para passar bem por cima de todas elas. Mas o que me motivou a escrever hoje foi uma questão muito sutil que parece estar plantada como um germe no inconsciente de tantas de nós (talvez de todas em maior ou menor grau).

Um certo complexo de mártir, uma santidade efêmera que nos diz para ter paciência, que as coisas vão melhorar, que nosso cuidado e atenção vão transformar as pessoas e o mundo ao nosso redor.

E que se sofremos, se estamos exaustas de lavar os pratos sozinhas enquanto toda a família assiste a TV (para dizer o mínimo) é porque o mundo é assim e somos muito boas e santas, cuidadoras da família. 

Não tenho aqui a intenção de encontrar respostas ou mostrar caminhos, eu mesma desconheço a solução para esse impasse que esteja mais próxima da realidade e distante da utopia. Mas as mulheres sempre encontram um caminho, uma curva, para expurgar o peso das violências acumuladas. E a minha curva pessoas, é vir aqui e digitar.  


Autora: Joelma Stella é mestranda, trabalhadora de home office que luta para cumprir os horários e mãe de Caetano de oito anos. Instagram: @_jostella_. 

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