Mulheres-mães protagonistas da própria história

A perda da nossa individualidade dói.

A perda da nossa individualidade dói.

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Sinto falta de quem eu era antes da maternidade. É difícil falar isso sem sentir uma culpa enorme invadir os meus pensamentos.

Que saudade de passar horas sozinha, ouvindo música, lendo um livro ou fazendo qualquer coisa sem gritos e choros atrás de mim.

É tão sufocante quando a gente perde a individualidade, quando já não somos mais só a gente, e sim somos a morada de alguém.

Não é que eu não goste de ser morada, de ser abrigo. Pelo contrário, amo que meus braços sejam o lugar mais seguro para a minha filha.

Mas e onde é o meu abrigo?

Para onde vou quando tudo ao redor parece desmoronar?

Eu que dou tanto colo já nem lembro o que é receber um.

Me olho no espelho e noto como tudo mudou, por dentro, por fora, por tudo.

Absolutamente tudo mudou em mim.

Minha forma de ver o mundo, de me relacionar com as pessoas, de sentir.

Sigo tentando me descobrir. Mas como?

Como, se cada pensamento meu é interrompido por gritos, choros e pedidos de colo?

Como posso respirar sem sentir um peso enorme sendo que estou perdida entre fraldas e roupinhas minúsculas?

Amo demais o cheirinho do pescocinho da minha filha, mas sinto tanta falta do cheirinho de liberdade de ser uma pessoa que não precisa carregar um outro ser tão dependente.

Me perdi nos dias, nas horas, nas mamadas infinitas, no rabo de cavalo que já não sai mais de mim, nos soluços da madrugada.

Me perco tentando dar o meu melhor, pra no final do dia notar que  não fiz nem metade do que planejei.

Não se engane, não foi nada fácil dizer essas palavras, todas elas estão mergulhadas em um rio de culpa e vergonha.

Porque vivem dizendo que temos que amar ser mãe, que todas as mães amam a maternidade e que temos que agradecer todos os dias por isso.

E eu amo a minha filha, mais do que jamais vou saber explicar. Mas não consigo gostar de ser mãe, não consigo gostar da forma como a maternidade é vista na nossa sociedade.

É como se tivéssemos que deixar de lado o fato de sermos humanas, mulheres, amigas, pra virarmos só mães.

Não consigo gostar da maternidade porque não é bonito a gente se doar até ter vontade de gritar pedindo socorro, por conta da exaustão.

Não consigo romantizar o fato de termos que aguentar o mundo nas costas e nem ter o direito de reclamar.

Só hoje já pedi socorro umas mil vezes. Mas de que adianta implorar por ajuda se não tem ninguém pra me ouvir?

Só hoje já pensei em desistir mais algumas mil vezes. Mas como eu poderia?

Só hoje  já me julguei muitas vezes. Me cobrei outras muitas vezes.

Sinto falta de ser alguém que importa, de ser uma pessoa levada em consideração pelas outras em volta.

Mas agora já não me enxergam mais, já não veem minha singularidade, minha individualidade, meus gostos e sonhos.

Já não me dão mais colo.

Já não me perguntam como estou.

É sempre “Como a tua filha está?”

Não me entenda mal, fico muito feliz por minha filha ser um ser amado, mas será que é difícil lembrar que quem tanto cuida também precisa ser cuidado?

Pra escrever esse desabafo fui interrompida pelo menos umas seis vezes. Ainda não consegui ir ao banheiro, não lavei o rosto hoje.

Quanto mais abraço minha humanidade mais parece que tentam arrancá-la de mim.

Essa exaustão não é bonita. É dolorida, pesada e machuca.

Dizem que sou forte, que aguento as dificuldades, que me admiram por isso. Mas sinceramente se pra ser forte  preciso carregar tanta coisa a ponto de estar explodindo… então, por favor, me devolva o direito de ser fraca.


Texto: Manuela Laurindo – Instagram: @laurindomanu.


Revisado por Daiane Martins.

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Uma resposta

  1. Dani querida,
    Já passei e passo (eternamente talvez 🤔) em dose dupla… Já me senti mil vezes com essa vontade de desistir e em muitos momentos ainda sinto, mesmo uma com 6 e outro com 5 anos… Daí eu percebi que estava me cobrando diante de um mundo que cobra a gente… Sermos independentes, bem sucedidas, lindas sempre… Quando tive tempo pra pensar (rs) percebi que todas essas coisas que citei não seriam possíveis de encontrar e permanecer numa felicidade sem ter as crianças… Me imaginei trabalhando no emprego dos Sonhos sem meus filhos, pode parecer bobo esse pensamento mas me aliviou por 2 minutos e depois fui coberta por um vazio tremendo. Sabemos que não é essa questão, não queremos não ter filhos ou nos desfazermos deles, óbvio! Sei o que está dizendo, é sobre exaustão… Então quando comecei a perceber que minha individualidade também não teria mais sentido, não por muito tempo, eu busquei forças (essa que até queremos mandar pra pqp as vezes), sabendo que ali, no meu maior desafio insano, era o único lugar com real motivo para me reerguer.
    Que não nos cobremos na fraqueza pq sem ela não existiria força! Bjuuuu

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