Meu intuito era escrever intercalando com um texto informativo e um texto sobre a vivência da maternidade atípica, mas um acontecimento na última semana me trouxe uma série de indignações que precisam ser expressas para ver se conseguimos abrir uma brecha na cabeça de pessoas que não enfrentam diariamente o que nós enfrentamos.
Na última semana vimos o caso da Sara Onori, mãe de um menino autista de 2 anos de idade, que recebeu uma mensagem via Whatsapp de uma antiga “amiga” dizendo que ela não ia convidar o filho da Sara por ele ser PROBLEMÁTICO, dizendo que as outras crianças ficariam incomodadas e finalizou com um “Espero que você entenda”. Relembre o caso aqui.
Sim, o Brasil entendeu que essa mulher não passa de uma pessoa sem empatia, preconceituosa, sem noção e que ainda usa as outras crianças pra mascarar a própria falta de caráter, uma vez que todas as crianças que eu conheci até hoje (pelo menos dessa idade) brincam entre si normalmente como se não houvesse amanhã, principalmente em uma festinha de aniversário regada a docinhos e risadas.
Mas além disso, em vários comentários que pude ler em diversas páginas onde o caso foi divulgado, entendi que as pessoas não têm a mínima empatia pela dignidade da criança e isso me exaltou os ânimos mesmo em uma semana de cama. Cheguei a ter uma discussão com uma mulher – que NÃO é uma mãe atípica – que dizia para a Sara fazer uma festa E CONVIDAR esta que excluiu sem a menor cerimônia o filho autista, para provar que ela é superior.
Esse pensamento vem quase de um martírio religioso, um autoflagelo, querendo mostrar que as pessoas são “superiores” trazendo seres como este para perto daqueles que um dia eles maltrataram. Ou seja, a pessoa destrata os nossos filhos e a gente tem que TRAZER essa pessoa pra perto de nós depois de todo o sofrimento causado pela mesma, pra comemorar a nossa felicidade sendo que ela fez parte justamente do contrário, ela causou um momento de dor e sofrimento e pra quê? Pros outros acharem bonitinho? Quero mais que se lasque!
Uma criança autista ou com qualquer outro transtorno ou deficiência ou que sofra qualquer tipo de preconceito não deve ser exposta a esse tipo de gente. Esse tipo de gente tem mais é que ficar longe dos nossos filhos, da nossa casa, da nossa vida. Gente que não faz a menor cerimônia de excluir nossos filhos, que são capazes de maltratar se tiverem a oportunidade, que não fazem questão da amizade que mantiveram por anos, essas pessoas não são merecedoras da presença, do carinho, do amor dos nossos filhos. E é nosso dever proteger nossos pequenos desse tipo de gente.
Nessa ideia que parece ser inofensiva, uma síndrome de bom samaritano, se esconde uma violência contra nossos filhos que não tem tamanho. Não é questão de ego de mãe, é uma questão de que um crime foi cometido contra nossos filhos. Conseguem entender isso? Um CRIME descrito no artigo 88 da Lei 13.146/2015. Passível de processo e pena. Você vai mesmo querer colocar um criminoso perto do seu filho, só para dar um de bom samaritano? Eu sei que eu não vou.
Não sei se essa foi a primeira exclusão que eles viveram, mas não será a última e nenhuma delas vai doer menos do que a outra, independente do que seja.
Toda exclusão dói. Dói na alma, dói no corpo, deixa doente, ferve o sangue, dá raiva. E mesmo assim tem uma sociedade inteira que não se importa com a integridade dos nossos filhos.
Muitos dizem “Ah, foi só uma festinha”, “ah, mas ta fazendo drama”. Para essas pessoas NUNCA vai doer como dói na gente. E fica pior quando os filhos começam a entender e perguntam: “Mãe, por que eles não gostam de mim?”.
Onde eu moro tem uma piscina e tem uma menina em específico que eu já conversei com ela diversas vezes sobre a forma como ela trata a minha filha. Sempre na paz, com aquele espírito de mãe e (quase) pedagoga. Disse que as pessoas são diferentes, que ninguém é obrigado a ser amigo de ninguém se não quiser, mas destratar não é correto porque ela não tem culpa de ser como é, e que ela VAI continuar frequentando a piscina todos os dias de calor possíveis porque é uma das poucas atividades de lazer que ela gosta.
Mesmo assim minha filha me pergunta sempre o por quê de as crianças não gostarem dela como ela é e eu ainda não tenho respostas para isso. Esse conselho vindo de ninguém menos como Frida Kahlo, serve pra todo mundo. Serve para a mulher que tem um relacionamento monogâmico e é traída o tempo todo pelo marido, serve para os familiares que te tratam mal, serve para aquela padaria onde o atendimento é péssimo, serve para o que for.
Onde não puderes amar, onde não encontrares amor, onde não fores bem tratado, não te demores.
Acredite em mim, seu filho não vai ficar isolado porque tem uma infinidade de pessoas que vai amar seu filho, vai apoiar vocês na luta, vai brincar junto, rir junto, chorar junto, assim como infelizmente vai ter muita gente para agir assim ou pior com eles. Não te demores, não venha com essa bondade cristã às custas de quem você ama.
Filhos são para sempre; os outros são só os outros.
Autora: Lily Sagi.
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