Por Camilla Goes – @camillagoesb
Nesse mês de agosto, comemoramos o Dia dos Pais e, com essa data, ressurgem diversas reflexões acerca desse papel tão importante do homem, mas tão precarizado e ignorado pela sociedade.
Envidamos nosso esforço em fortalecer e empoderar a maternidade, o que é justo e necessário. O problema é que, em muitas dessas tentativas, temos ainda que ter o cuidado de não enfraquecer o movimento tentando fortalecê-lo ao ponto de desincumbir os homens da paternidade que precisam exercer.
Quando falamos de Maternidade, falamos, sim, de uma questão de gênero.
A maternidade é o reflexo de uma cultura de gênero que se apropria do corpo, da mente, do psicológico, da economia, do social e do emocional das mulheres.
Às mulheres, todos os direitos, mas, com eles, tem vindo ainda todas as cobranças, as pressões e opressão para o equilíbrio divino e bonito dos pratos. Se possui manchas ou algum arranhão, logo o viés inconsciente da condenação vem à tona: talvez você não seja tão boa assim.
Como uma prosa, a maternidade tem seus momentos de calmaria e outros de tensão. Às vezes, sem querer, até rima. Tem uma cadência rítmica, por vezes veloz, por vezes devagar, mas constante. Não sossega. Não termina. Os pontos somente separam alguns períodos, o que também acontece com vírgulas.
A paternidade, por sua vez, é tratada como uma poesia. Sempre pontual e específica. Pode até não rimar, mas sua própria limitação gráfica a justifica. Termina quando achávamos que ia começar. Não se compromete com coerência, cadência ou coesão. Se comete notórios erros e aborda absurdos públicos, ainda se reserva o direito de conceituar tais episódios como licença (poética).
Mas a criança, nosso principal leitor, não pode ficar à mercê desse jogo de gêneros.
Mãe não deve ser só prosa e pai não deve ser só poesia.
Precisamos construir o gênero família para que ambos possam ser os dois. Isso inicia com a equidade de gênero social para chegarmos a textual.
Precisamos falar sobre exercício de direitos e deveres quanto à parentalidade, de vieses inconscientes relacionados a gênero, de definição dos papéis no âmbito familiar, no conceito de casamento e deveres conjugais de ambos os pares, de educação familiar e econômica nos novos contextos de relacionamentos.
Precisamos parar de culpabilizar mulheres por serem as mães que devem ser quando os pais incorrem em falta e ausência.
Ao anunciar a maternidade à Maria, o anjo Gabriel a surpreende com um desafio prontamente aceito. A José, foi-lhe oportunizado pensar, refletir e até optar, levando-nos a infeliz interpretação de que ser pai pode ser uma opção aos homens e ser mãe um destino divino às mulheres.
Até mesmo para quem não acredita em Jesus, a referência parece se perpetuar historicamente.
Não faz sentido.
Convidamos a aproveitarmos o mês para refletirmos sobre que referências parentais temos e como elas se compatibilizam (ou não) com nossos atuais cenários de exercício de maternidade e paternidade; qual o grau de participação paterna a torna compatível com a doação maternal na criação dos filhos; como os homens podem ser coprotagonistas nos cuidados com a prole; o quão leve se torna a maternidade se a paternidade é exercida em sua inteireza e, finalmente, como ser mãe é poético quando o pai não foge às necessárias prosas.