Julho chega e, com ele, o recesso escolar e uma série de hábitos afetivos que giram em torno da mesa: chocolate quente, fondue, pão de queijo, massas, doces caseiros. Para muitas famílias, esses momentos são sinônimo de união, mas também de culpa e desconforto. Afinal, boa parte das pessoas cresceu ouvindo que “comida de férias” é um excesso que precisa ser compensado depois.
Para a nutricionista franco-brasileira, pesquisadora em Neurociência do comportamento alimentar e doutora pela USP, Sophie Deram, esse tipo de pensamento revela um problema cultural: o prazer de comer foi demonizado e transformado em motivo de punição.
“Comer com prazer virou sinônimo de fraqueza, especialmente para as mulheres. Mas proibir alimentos só aumenta a obsessão por eles. Férias não deveriam ser um gatilho de sofrimento e sim uma oportunidade de criar boas memórias em torno da comida”, afirma Sophie, autora do livro O Peso das Dietas e referência nacional em nutrição consciente.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA), o consumo de alimentos ultraprocessados cresce cerca de 20% durante o mês de julho, especialmente em viagens e em lares com crianças.
O dado é frequentemente usado para reforçar mensagens de alerta, mas, na visão da especialista, é preciso cuidado para que esse discurso não aprofunde ainda mais o medo alimentar. Sophie explica que o exagero não está na comida em si, mas na maneira rígida como fomos ensinados a lidar com ela: em ciclos de proibição e descontrole, onde ou tudo é permitido ou tudo é condenado. Sophie reforça que a simples escolha de mais comida fresca e caseira e menos industrializada já traz uma melhora da qualidade mesmo que seja chocolate quente ou bolos etc., são alimentos nutritivos e interessantes quando consumidos em paz
Para a nutricionista, o caminho mais saudável para uma relação equilibrada com a comida começa na infância e passa pela escuta corporal, pelo prazer e pela autonomia. Ao invés de listas de “proibidos”, ela propõe que os adultos ensinem as crianças a fazer escolhas a partir da consciência, e não da culpa. Isso inclui convidá-las para participar do preparo dos alimentos, entender os sinais de fome e saciedade, reconhecer os alimentos que dão prazer e acolher o fato de que comer é também um ato social e emocional.
“Férias significam pausa. Pausa para descansar, para brincar e também para aproveitar os sabores da estação. Não é o chocolate quente que causa problemas, mas a crença de que ele é um erro”, diz. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 340 milhões de crianças e adolescentes vivem com sobrepeso ou obesidade no mundo, e o excesso de controle alimentar, somado ao estigma do corpo, é apontado como fator de risco para transtornos alimentares.
O mês de julho, portanto, pode ser um momento potente para rever crenças e mudar narrativas. Comida não precisa ser motivo de ansiedade, e sim de vínculo, conexão e afeto. Comer bem também é comer com leveza e isso inclui o que se serve à mesa nas férias.
Sobre a especialista: Sophie Deram é nutricionista, autora best-seller, pesquisadora e uma das principais vozes no Brasil sobre alimentação consciente e comportamento alimentar. Francesa naturalizada brasileira, é doutora pela USP e coordena o projeto de genética do Ambulatório de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (IPq-HC-FMUSP), com pesquisas em obesidade infantil, nutrigenômica e neurociência do comportamento alimentar. Autora dos livros O Peso das Dietas e Os 7 Pilares da Saúde Alimentar, Sophie é referência nacional em práticas nutricionais humanizadas e baseadas em ciência. Em seus atendimentos, palestras e conteúdos, defende o fim das dietas restritivas e o resgate do prazer de comer, influenciando milhares de pessoas a repensarem sua relação com a comida.





