A casa das memórias: reflorestar o agora com as sementes plantadas pelos meus ancestrais

A casa das memórias: reflorestar o agora com as sementes plantadas pelos meus ancestrais

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Por Carla Pepe – @Morenaflor.blog

Desde o falecimento do meu tio, nossa família tem vivido momentos de imersão. A chave abre a casa e a viagem no tempo começa. A casa das memórias tem a capacidade de nos tragar imediatamente, entre teias, aranhas e pó, vamos entrelaçando e fiando outras teias. Eu e minha irmã temos vivido uma viagem no tempo através de documentos, fotos, registros, objetos. Quantas histórias são guardadas e aos poucos vão sendo reveladas partidas dos griôs das famílias? 

Mesmo que as ciências exatas ainda não tenham inventado uma máquina como as que vemos em filmes, adentrar na casa das memórias é a experiência real de estar em uma máquina do tempo.

A Casa das Memórias, também foi a minha casa, lugar onde vivi dos 9 aos 23 anos. A cada viagem na máquina do tempo, no virar da chave, eu me vejo com 9 anos, meus olhos marejam e sou teletransportada para tempos atrás. Eu consigo escutar o arrastar de chinelos da minha avó, o cheiro do perfume “Alma de Flores”, o cheiro do café e da rabada no fogão, posso escutar suas vozes falando alto qualquer assunto. 

Na Casa das Memórias, os documentos contam as histórias: da morte precoce de minha avó biológica, as doenças e casamentos de uma tia-avó que nunca conhecemos, o certificado de ida a 2a Guerra Mundial do meu avô, as certidões de nascimento de minha mãe e seus irmãos.

Entre xícaras delicadas e copos quebrados, descobrimos desenhos, letras, contos, livros. O afeto fica latente nas fotos encontradas: os 15 anos da minha mãe, os 70 anos da minha avó, o casamento dos meus avós, foto de uma peça infantil da minha irmã, a infância da minha mãe e dos irmãos, as cantigas e contos compostos pelo meu tio, os títulos acadêmicos dos meus tios, meus desenhos e primeiras letras. 

No processo de construir novas formas de existir, refloresto o tempo presente com as sementes plantadas por aqueles que vieram antes de mim. A minha coragem, a força, o amor sempre estiveram presentes ali. Eu tenho cicatrizes, choro, lembranças, cada um de nós tem uma forma diferente de enfrentar as viagens no tempo. Eu, como pisciana raiz, só poderia vivenciar essa experiência desaguando e escrevendo como forma de resistência. 

Se eu puder te dar um conselho: escute os mais velhos de sua família, peça-lhes que conte suas histórias, tire fotos, registre os momentos. A casa das memórias é construída com os tijolos do passado e o afeto é o cimento que dá a liga e que mantém tudo forte. Os meus sonhos e a minha luta não começaram hoje, eu voltei para eles para ir mais longe amanhã, porque o futuro, como diz Emicida, é ancestral. 

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