Mulheres-mães protagonistas da própria história

Para você, mãe arrependida

Para você, mãe arrependida

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Eu li um desabafo triste, tocante e verdadeiro de uma mãe. Ela dizia estar arrependida de ter tido seu filho. Engravidou aos 21 anos e foi abandonada pelo pai do bebê que, “muito jovem para ser pai”, só iria conhecer a criança quando estivesse “estabelecido na vida” e pudesse ter condições de ser uma boa referência.

Essa mãe foi também abandonada pela sua família, que não tinha condições de sustentar mais uma boca em casa: “Arque sozinha com as escolhas que fez” – ouviu do próprio pai. A mãe silenciou.

Precisou parar de estudar, precisou trabalhar, precisou sustentar seu filho, precisou buscar uma creche, precisou enfrentar sozinha todas as dificuldades de uma maternidade não planejada. Precisou de amparo e de suporte. Tudo lhe foi negado. Ela seguiu. Sozinha, arrependida, mas seguiu. Assim como muitas seguem, sem amparo, sem suporte e sem compaixão.

Essa mãe me comoveu a ponto de desejar abraçá-la, olhar nos seus olhos e dizer: Você não está sozinha.

Há muitas mulheres como você, e este mundo seria muito melhor – para você e para todos – se a sagrada missão de gerar e parir não fosse imposta a todas nós, mesmo àquelas que não querem, não podem ou não estão preparadas. Você é muito corajosa em admitir-se vulnerável, e isso me faz crer em sua força.

Admitir essa impossibilidade (falta de desejo ou falta de preparo), seja por qual via ela se apresente, é negar a sacralidade, é negar a benção divina de ser mulher. É colocar-se na condição de pecadora, vestindo o manto da indignidade. É permitir que milhares de dedos  sejam apontados para você em incansáveis acusações e perguntas.

É fechar-se em um universo solitário de desespero e exaustão que apenas as mães solo podem compreender.

Contudo, eu posso apostar que, nesse seu lugar de abandono, grande parte das mães (solo ou não, arrependidas ou não) já estiveram em algum momento do seu maternar, pois o mundo não costuma ser muito bondoso com as mulheres, e quanto mais adjetivos próprios do sexo feminino acumulamos em nosso ser, mais difícil tende a ser este caminhar. Quem é mulher sabe.

Então, eu gostaria muito de poder dizer a você, mulher, mãe, abandonada, arrependida:

Talvez, a luta pela não romantização da maternidade nunca gere frutos dos quais você possa usufruir. Talvez um debate real e sem julgamentos sobre políticas de alternativas à maternidade, como a entrega consciente, não irão tornar nossa sociedade menos doente a ponto de te conceder alternativas. Talvez a educação dos homens não mude a tempo de fazer o pai do seu filho entender que a paternidade precisa ser abraçada com compromisso real e responsabilidade emocional, obrigações que vão além do pagar. Talvez sua família nunca chegue a compreender o amor como algo grandioso, através do qual suporte e apoio podem ser oferecidos para além da possibilidade financeira.

Não sou capaz de conhecer sua realidade  que condensa tantos adjetivos capazes de fazê-la se questionar todos os dias a respeito de suas escolhas, mas sou capaz de compreender perfeitamente que você é apenas mais uma vítima desse não taxativo rol de situações ao qual foi sujeita.

E, se há algum consolo nisso, desejo que (embora vítima) você não ocupe esse lugar. Desejo que, sendo forte (apesar de digna de toda eventual queda ao longo do caminho) você se levante em cada momento de fraqueza e solidão, lembrando-se não ser a única. Sua dor é a de muitas e estas, se não conseguiram superar, encontraram meios de seguir – apesar dela. Use sua voz para encontrá-las e com elas, encontre sentido, encontre luz.

Siga, fale, não se cale. Faça-se ouvir. Quando encontrar ajuda e suporte, aceite. E, apesar de toda dor e arrependimento, permita-se. Permita-se sorrir, abraçar, amar, aprender, errar, tentar de novo.

Não tema os rugidos que sua voz possa vir a causar. Busque cura para suas mágoas, para que elas não ceguem sua possibilidade de olhar adiante. Cure suas feridas, para que você possa ver o mundo além delas.

Como ser humano, como mulher e como mãe permita o seu coração sentir toda força originada de sua honestidade consigo mesma. Estar abandonada, cansada e arrependida não é sua culpa. A sua vulnerabilidade te faz humana, e reconhecê-la é um lindo modo de mostrar ao seu filho como ser um homem de verdade.

Não importa qual é o sentimento predominante dentro de você, de que modo essa relação vem sendo construída com seu filho, não atribua a ele nenhuma responsabilidade. Vigie-se nessa tentativa entendendo, especialmente, que você não precisa ser perfeita para concluir esse trabalho tão árduo de conduzi-lo pela vida.

Seu filho é sua obra. Desejo sinceramente que você encontre nele toda fonte de inspiração e amor para seguir. Que, apesar do arrependimento e dos caminhos tortuosos pelos quais esse vínculo se constrói, que ele seja uma fonte inesgotável de esperança em dias melhores.

Desejo que você aprenda a amá-lo de forma gratuita e genuína, pois sendo capaz de amar, você entregará ao mundo, como fruto de sua luta, um ser humano capaz de fazer diferente, honrando a sua história e a de sua mãe. Que ele seja, assim, seu maior sacrifício, mas também, sua maior recompensa.

Receba meu abraço, minha admiração e meu carinho. Receba meu apoio, e que mesmo apenas em pensamento, ele possa te inspirar a continuar.


Por: Elisa Ortolan – @elisaortolancosta.

Revisado por Daiane Martins.

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