Como farmacêutica e toxicologista, busco evitar o impacto negativo das substâncias no corpo humano. Como mãe, tenho medo de como esses elementos podem afetar a saúde do meu filho. Durante a gravidez, fui cuidadosa até com o uso de cosméticos, mas, quando meu bebê nasceu, percebi que havia um novo inimigo para a infância, um que eu ainda não imaginava ser tão presente: o vício em dopamina, ou seja, em tecnologias e redes sociais.
A dopamina é um neurotransmissor fundamental no mecanismo de recompensa do cérebro, relacionada ao processo de prazer. No entanto, em excesso, ela pode causar problemas. Do ponto de vista toxicológico, a dopamina está associada aos vícios, como no exemplo da cocaína, que prolonga sua ação, aumentando a sensação de prazer e consequentemente induzindo a dependência.
Embora conheçamos amplamente os impactos das substâncias no corpo, muitas vezes ignoramos que nossos cérebros também podem ser “sobrecarregados” por estímulos digitais. Isso se torna ainda mais alarmante quando falamos de crianças, que estão em fase de desenvolvimento e são particularmente vulneráveis.
O vício digital, ao liberar dopamina em excesso, não só altera o equilíbrio químico do cérebro, mas também prejudica áreas responsáveis pelo controle de impulsos, memória e tomada de decisões. Os algoritmos feitos para “prender” a atenção delas nas telas têm alterado o perfil comportamental de toda uma geração.
Diante disso, vejo os desafios de criar meu filho em um mundo onde as telas são o caminho mais rápido para o entretenimento, o aprendizado e até mesmo a socialização. Cada clique ou deslize nas redes sociais libera dopamina, criando ciclos de recompensa que moldam hábitos e comportamentos. O que isso significa para o futuro emocional e cognitivo das nossas crianças?
Como Albert Einstein disse: “O espírito humano precisa prevalecer sobre a tecnologia”. Essa reflexão tem me preocupado como mãe. Como posso estimular a comunicação do meu filho, se vejo crianças e adultos frequentemente dando uma olhadinha no celular durante as conversas, não existindo mais contato visual? Como posso incentivá-lo a desenvolver a coordenação motora se, hoje, grande parte das interações no mundo acontece de forma digital e não manuscrita?
Essas questões me fazem refletir sobre o futuro das nossas crianças em um ambiente cada vez mais tecnológico. Como mãe e profissional da saúde, fico receosa de como esse vício pode atingir o meu pequeno, principalmente porque ele tem apenas 1 ano e 3 meses. Com o avanço da inteligência artificial (IA), também teremos que considerar como as crianças serão moldadas nesse “novo mundo”. Inúmeros estudos têm nos alertado sobre o impacto negativo das telas em bebês, e a Sociedade Brasileira de Pediatria, inclusive, desaconselha totalmente o uso de eletrônicos nessa faixa etária. Para as outras idades, já se aceita o uso com monitoramento e por períodos curtos. Mas como os pais podem controlar o vício em telas se eles próprios também estão viciados?
O grande dilema que enfrentamos é como ajudar nossos filhos a desenvolverem um equilíbrio saudável em meio a um mundo digital. De um lado, temos o perfil de consumo e estético, de influenciadores digitais milionários, que minam a autoestima de adolescentes e adultos. Do outro lado, temos as inúmeras formas de “prender” as crianças em desenhos e músicas de autoestímulo. Infelizmente, não tenho todas as respostas para proteger nossos pequenos, mas, como mãe, sei o poder da influência que temos sobre eles. Para mim, a grande resposta para criar crianças saudáveis em um mundo intoxicado digitalmente é, antes de tudo, curar os adultos dessa intoxicação, começando pela reflexão e mudança em nosso próprio comportamento.
Por Nathalia Stephanie Oliveira Nascimento – @nath_oliveira