Passada as emoções que envolvem o “positivo”, esteja a gestante esperando ou não; muitas vezes, o pânico acaba sendo o sentimento subsequente. Sobretudo na realidade das pessoas que vivem do trabalho e travam a luta cotidiana pela sua sobrevivência e de suas famílias. “Como vou sustentar uma criança?”, “Como garantir que não falte nada a essa vida?”.
A situação que era puramente afetiva, acaba se tornando prática, objetiva. Os cifrões vêm à mente na mesma velocidade em que se projeta todas as expectativas de vida que possui por aquele amontoado de células em divisão.
Não é possível afirmar que todas as famílias irão experimentar a chegada de uma vida da mesma forma. Os fatores econômicos acabam sendo decisivos nesse processo, uma vez que a realidade brasileira é das mais desiguais do mundo.
Estima-se que a classe A (renda média mensal de 25 mil/mês) gaste em torno de 2,08 milhões com a criação de seus filhos ao longo da vida (0-23 anos), enquanto a classe D (menos de 2 mil/mês) gasta no mesmo período R$ 53 mil. Enquanto a classe A e B dispõe da maior parte desse recurso milionário para custear a educação de seus filhos, a classe C gasta para custear roupas e calçados. Enquanto, 23 mil do custo total da classe D é voltado à alimentação.
Em outras palavras, os ricos investem na formação de seus filhos, a classe média preocupa-se em ornamentar os teus, enquanto os mais pobres preocupam-se em não deixar que passem fome.
A entidade “mercado” sabe desses dados e de muitos outros. Oferecendo um terreno favorável de crescimento nesse setor da economia, sobretudo por meio das vendas online.
E de repente, aquele projeto afetivo que envolve de diferentes maneiras as diferentes matrizes familiares (solo/ nuclear/ constelar) se torna um pesadelo econômico de forma perversa.
Podemos debater em profundidade, em outro momento, a romantização da criação, sobretudo em relação aos impactos do papel da mulher quanto a maternagem “ideal”.
Fato é que o “público-alvo” permanece sendo essa mulher, que na primeira gestação projeta expectativas nessa experiência. Incorporando necessidades do mercado (lucro/venda) como se fossem tuas e de seus bebês. Estima-se que o gasto médio entre a gestação e o primeiro ano do bebê chegue a 5 mil reais, entre o necessário e o que o mercado empurra como necessário.
Seja uma almofada de banho de “100 conto”, ou um móbile ultra tecnológico que promete fazer milagre no desenvolvimento cognitivo da criança.
Sem falar do crescimento exponencial de cursos de “coach materno” que vendem a prática da criação e da educação como se estivessem disponibilizando no mercado o santo graal do sono perfeito, da mamada mais que perfeita, dos estímulos mais verdadeiros.
É evidente que não se trata de defender que haja “instintos” inatos que nos garantem sucesso na prática da educação de nossos filhos. É preciso se preparar e ter amparo social para que esta prática deixe de ser um processo individual e permeado de culpas, sobretudo para as mães. Mas é preciso respirar e ver além da etiqueta, da estética e do que impõe o mercado como importante e necessário. Senão, sucumbiremos ansiosas, falidas e desprovidas do valor real de gestar e reproduzir a vida humana.
Autora: Luciana Brauna. Cientista Social, mãe de duas, ativista social, educadora e poeta escrevivente. @luciana.brauna
Este texto foi revisado por Fernanda Sousa.