Mulheres-mães protagonistas da própria história

Mulheres que furam a fila

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Por Laureana Feitosa – @observatoriomeioambiente

Um dia eu acordei e percebi que não havia dormido. Percebi que logo depois do jantar, e do banho e de colocar o meu filho para dormir, eu continuei direto de olhos abertos no escuro até de manhã.

O que me “acordou” da minha insônia, foram os barulhos matutinos. Percebi o canto dos pássaros, notei uma leve claridade entrando pela casa timidamente, como quem não quer assustar a mulher que se acostumou com as horas escuras da madrugada.

Me dei conta que eu havia passado mais uma noite sem dormir. E não notei logo de cara, porque não houve silêncio na minha cabeça, os pensamentos não calaram para ouvir o comando do cérebro reivindicando um descanso.

O barulho na minha cabeça, começa com preocupações de mãe, depois vai para preocupações de dona de casa, depois vai para preocupações de esposa, e quando finalmente começo a pensar em mim, como um ser único que não é porque outros são, aí já preciso “acordar”. O dia chama. E tudo que foi pensado sobre as preocupações da mãe, da dona de casa e da esposa, farão parte desse dia (que já nasce como um novo dia, sem que eu nem mesmo tenha descansado do dia anterior).

Não deu tempo pensar sobre mim nessa madrugada. Três outras versões minhas, se acharam mais importantes e furaram a fila. Porém eu cheguei primeiro. Eu sempre estive aqui. Estive aqui quando eu era um bebê, uma criança, uma adolescente, e estou aqui agora sendo uma mulher. Mas não tive tempo de pensar sobre eu mulher nessa madrugada.

Quem sabe hoje a noite. Espero que no transe da minha insônia, a mãe, a esposa e a dona de casa consigam dormir. Se elas dormirem eu vou pensar sobre mim. Pensar sobre aquele curso, sobre aquela viagem, pensar sobre essa fase de ser mulher que chegou tão rápido. Ainda tenho gostos de adolescente…

Será mesmo que devo esperar elas dormirem? Talvez eu deva simplesmente ignorá-las e furar a fila também. 

Me pergunto qual a urgência dessas mulheres para precisarem furar a fila. Será que a mãe precisa descansar? Será que a dona de casa quer fazer um curso? Talvez a esposa queira viajar… E eu? O que essa mulher quer? 

Só penso naquele livro… E se eu escreve um? 

É… estou meio envergonhada com a minha urgência. Talvez eu pudesse pensar sobre o livro durante do descanso da mãe, ou na viagem da esposa… 

Ouço os canto dos pássaros agora.

Uma luz tímida está entrando na casa. O dia chegou. 

Pensei, afinal? Ou foram elas? Furaram  a fila de novo? Ou eu furei finalmente e esqueci a vergonha da minha urgência? 

Terei que tentar responder isso, essa noite. 

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