Mulheres-mães protagonistas da própria história

Não era amor: quando me descobri virgem de relacionamentos amorosos

Não era amor: quando me descobri virgem de relacionamentos amorosos

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Antes de tudo, preciso te avisar que a descrição a seguir pode ativar memórias dolorosas na sua mente. Assim, se estiver em momento sensível da sua vida, recomendo que não continue a leitura deste texto. 

Baseado em fatos da minha vida, segue a história:

Vivendo um relacionamento de idas e vindas com meu namorado, em um dos momentos de separação, decido ficar com um cara. Pouco tempo depois, retomamos o namoro e voltamos a sentir muito afeto um pelo outro. 

De repente, ele começa a me perguntar se eu tinha ficado com alguém durante nossa separação. Acho estranho a pergunta e o tom de voz que ele usa para fazê-la. Com medo, minto e digo que não. 

Os dias passam e sou interrogada frequentemente sobre o mesmo assunto, sendo que agora ele quer saber se eu tinha ficado com uma pessoa específica (de fato, o cara que eu tinha ficado). Continuo negando e sinto muito medo dele, do que ele poderia fazer se descobrisse a verdade. 

Ainda que estivesse solteira quando fiquei com o rapaz, a maneira como ele me perguntava dava a sensação de que eu havia feito algo muito errado. Dias depois, ele “joga verde” como meu melhor amigo dizendo: “Ah, eu sei que a Carla ficou com o fulano viu?”. E meu amigo inocentemente responde: “Qual o problema? Ela estava solteira quando isso aconteceu.” 

Enfurecido, ele me liga chorando e gritando, me chama de p*ta, v*dia e outras coisas piores. Fico atônita, me sinto péssima e corro pra casa dele à noite. Ele não atende o telefone e parece não estar em casa. 

Desesperada e chorando sem parar, não consigo voltar para casa e passo a madrugada na rua, na porta da casa dele. Eu estava sozinha, com medo, com fome, sede e frio. Ele chega de manhã cedo, não me oferece nada, entra mudo em casa e eu me jogo no chão pedindo desculpas. Ele me xinga várias vezes e diz que está tudo acabado. Eu imploro perdão e que não me deixe. Ele não aceita. 

Eu tenho a memória deste momento carimbada na minha mente. Eu sempre revivi aquele dia como uma lembrança de uma relação amorosa que não deu certo. Até ontem. Ontem, na terapia, eu reconheci um outro lugar. Entendi que não era amor. E quero te ajudar a entender isso também. O que acabei de descrever a você tem nome e se chama “Ciclo de violência do relacionamento abusivo”. 

A primeira etapa é a lua de mel, o momento que você sente esperança que esta relação é boa, que te faz bem, apesar dos pesares. Parece haver reciprocidade, parece haver amor! Foi assim que me senti quando retomamos o namoro naquele momento. Pouco tempo depois surge o momento de tensão. Neste caso, era seu contínuo interrogatório sobre o que eu fiz quando estávamos separados. 

As perguntas chegavam com um tom de raiva que me deixava tensa, assustada. O medo me fez negar automaticamente. Daí seguiu-se a violência. Quando ele descobre a verdade, começa o ataque, a violência psicológica. Sou tratada com total desprezo, raiva e sou torturada pelas suas palavras e comportamento. Detalhe: ele gritava, xingava e dizia que iria se vingar (e assim o fez meses depois. Me traiu com uma menina enquanto estávamos juntos). Objetivamente eu não fiz nada de errado, mas não adiantava. A violência psicológica e a manipulação sentimental me fizeram sentir uma culpa que me levou a um estado de depressão e ansiedade profundas. 

Este ciclo se repetiu diversas vezes neste relacionamento. E em outros relacionamentos. Na verdade, em TODOS os meus relacionamentos. E aí entra meu esclarecimento após a terapia: não era amor, era violência. Em nenhum destes relacionamentos eu experimentei amor, porque, para tal, é necessário vulnerabilidade, entrega e que os dois estejam em posições iguais. No relacionamento de violência, sempre somos colocadas em um local de inferioridade, onde somos submetidas aos comportamentos abusivos do parceiro. 

Concluindo, se nunca foi amor, eu nunca experimentei relações amorosas, sou “virgem” de relacionamentos de amor! E esta novidade interna me fez movimentar as minhas memórias de uma outra forma. 

Não posso deixar no mesmo espaço o que vivi nessas relações com minhas experiências de amor. Não há como dividir o lugar destes homens – que diziam me amar – com a memória amorosa do primeiro abraço que recebi do meu filho. Agora estas relações ficaram nas lembranças dos momentos difíceis, das épocas desafiadoras que já atravessaram a minha vida. 

E graças a essa “transferência de memórias”, hoje me sinto mais leve e feliz, afinal, enquanto estas lembranças de violência se misturavam as fidedignas memórias de amor que já experimentei, eu me sentia perturbada e confusa sobre o que é amor de verdade. Ou, eu cogitava que não fosse capaz de experimentar este sentimento com profundidade. No momento em que eu coloquei essas memórias em seu devido lugar, estou livre para dizer que eu sei o que é amor e o que não é amor. E aquilo não era amor.

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