Mulheres-mães protagonistas da própria história

“A bebida me fazia escapar até de amar minhas filhas.” Sobre Maternidade e Alcoolismo

“A bebida me fazia escapar até de amar minhas filhas.” Sobre Maternidade e Alcoolismo

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Seis anos! Faz seis anos que eu morri, mas também, faz seis anos que eu renasci. Renasci para a vida, para o mundo, para a maternidade.

Se você leu até aqui está pensando que eu “virei mãe” há seis anos, mas não, eu tenho uma filha de 13 e outra de 9 anos. Mas faz seis anos que eu cuido das minhas filhas como mãe. Por quê? Sou alcoólatra!

Tomei meu primeiro porre aos 14 anos, na casa dos meus avós maternos, uma garrafa de Capeta, direto de Porto Seguro, com qual eu fui presenteada. Mas bem antes disso já tomava vinho com um pouco de água e açúcar e chupava os pedacinhos de limão das caipirinhas.

Assim eu estreei no mundo de sonhos das bebidas alcoólicas. Dos 14 aos 19 anos estudava à noite, escola pública, ficava mais no barzinho do que na sala de aula. Nesses 5 anos entrei a primeira vez em coma alcoólico. Nem minha família ficou sabendo.

Aos 19, conheci meu marido, num dia dos namorados, depois de dormir no chão do banheiro, de uma festa de casamento. Eu bêbada e ele também. Engatamos o namoro e nossas saídas noturnas sempre eram regadas a muita bebida alcoólica, open bar, churrasco com os amigos, viagens e afins. 

Ele, pra não ficar pra trás, me acompanhava. Eu bebia muito, sempre fui resistente aos efeitos do álcool e a quantidade aumentava dependendo da comemoração ou decepção e nós bebíamos pra comemorar ou afogar as mágoas. É como dizem por aí: “Deus cuida dos bêbados e das crianças!” Não sei como não nos matamos nessas estradas voltando das baladas.

Chegamos em 2006, fiz cirurgia bariátrica e com ela comia menos e bebia mais, com isso, emagreci 65 quilos. Malu já tinha nascido e nem assim eu parava, muito pelo contrário, bebia ainda mais. Nunca “cuidei” dela… durante a semana era creche em tempo integral e finais de semana com as avós. Cheguei ao ponto de ir buscá-la na minha mãe tão embriagada que ela não deixou a gente sair com a menina de lá. Os anos foram passando e, cada dia mais, a quantidade de bebida aumentando. 

Inicialmente começava a beber na sexta e ia até o domingo, com o tempo, fui puxando pra quinta, quarta, terça…. No meus últimos meses de bebida, bebia todos os dias às 10 hrs da manhã, senão, tinha abstinência me dava tremedeira. E no meio dessa confusão fiquei grávida da Duda… e, dessa vez, durante a gravidez diminui, mas não deixei de beber.

Duda nasceu, e veio a depressão pós-parto! Não quis tomar remédio pra não ter que parar de beber… o primeiro ano foi uma barra. E a bebida, meu consolo. Com 3 anos a Duda era um problema na minha vida, me deu muito mais trabalho que a Malu, pra piorar comecei a trabalhar em casa, ou seja, mãe 24hrs por dia… pena que nunca estava sóbria.

O meu comportamento se refletia nas meninas… Duda sequer ficava sentada no meu colo, preferia até o colo de uma desconhecida do que o meu. Ela era meu bode expiatório, só falava coisas ruins dela, que era uma peste, que não devia ter nascido, etc etc… e isso refletia em seu comportamento. Com isso minha família ia se despedaçando… e a bebida, me consolando. Ela me fazia fugir da realidade. Escapar das obrigações de mãe… escapar até de amar minhas filhas.

A ficha caiu em 2013… mas o meu fundo do poço era fundo demais.

Aceitei ser puxada, a duras penas e sabia que se continuasse não ia ver minhas filhas crescerem. Veio o primeiro dia sem a bebida, o segundo, o primeiro mês. Foram 77 dias de abstinência, luta, choro, vontade de desistir, cheirando as garrafas para tentar melhor o meu estado. Nesses dias de luta fui percebendo que o que mantinha aquela Vanessa alegre, que topava todas, via e fazia graça com tudo foi morrendo.

Nascia, assim, uma nova mulher, mais madura, séria e comprometida.

Aos poucos fui me transmutando em mãe, filha, neta, esposa, profissional.

São 6 anos me reconstruindo de dentro pra fora, aos poucos, dia a dia, festa a festa, comemoração… O amor me salvou, o amor me fez forte, o amor me ensinou que quem gosta de nós fica, de qualquer forma ou jeito, ao nosso lado.

O alcoolismo é uma doença, a bebida alcoólica é a droga lícita que mais mata, mais vicia, acaba com famílias inteiras,  mas também a mais aceita em qualquer ambiente.

Hoje tenho história e sou exemplo para minhas filhas. Estou limpa, só por hoje!


Sobre a autora: Meu nome é Vanessa Romão, 39 anos, casada, mãe da Malu 13e Duda 9 anos… 2 cães e 2 gatos. Profissão? Muitas! Instrumentadora Cirúrgica,
Chef de Cozinha (já tive buffet é um food truck), além de Empreendedora, Design de Sobrancelhas…

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